“Tenho a certeza que sozinha não farei o mundo andar para a frente, mas serei mais um contributo nesse sentido.” Aos 23 anos, Inês Guerreiro será o elemento mais jovem do novo Comité Central do Partido Comunista Português (PCP), que sairá do XXII Congresso que decorre este fim de semana em Almada.
Parte da direção nacional da Juventude Comunista Portuguesa (JCP) desde 2016 e do PCP desde 2019, conta que já tinha familiares no partido e costumava ir à Festa do “Avante!” e a algumas manifestações. Contudo, só quando foi para o 10º ano e se confrontou com as “injustiças” que afetam alguns colegas é que decidiu juntar-se à ala jovem do partido.
“Dizem que é a idade da revolta”, comenta. Mas acredita que é esse confronto e a vontade de fazer alguma coisa para mudar essas injustiças que motivam a maioria dos jovens comunistas.
Na sua intervenção no congresso, anunciou para 17 e 18 de maio em Oeiras o XIII Congresso da JCP. Até lá, os jovens comunistas têm objetivos claros. A JCP quer reforçar a organização (350 novos recrutamentos e 50 novos coletivos) e aumentar a sua capacidade de iniciativa, mas também a sua ligação à juventude e às massas. “Sabemos que só assim a JCP fica mais forte e conseguimos avançar nos direitos da juventude”, afirma em entrevista ao Expresso.
1. O que é preciso para mais jovens se aproximarem do PCP?
É preciso fazer o que a JCP e o PCP já têm feito e sempre fizeram. É estar onde a juventude está. Estar na escola, nos locais de trabalho, nas faculdades e falar dos problemas que sentem no seu dia-a.dia. Mostrar-lhes que são comuns e mostrar-lhes aquilo que são capazes, especialmente quando tomam partido, quando se juntam à JCP e a partir daí se unem a outros também queiram lutar por uma vida melhor e contra as injustiças.
2. Mais de metade dos militantes do PCP têm mais de 64 anos. O que diz isto do PCP?
Não está desligado de todo o contexto histórico e da história do PCP. Nomeadamente do momento muito determinante na vida do nosso povo, do nosso país e do nosso partido, que foi a revolução de Abril e que naturalmente fez com que muitos jovens nessa altura aderissem ao partido. No momento revolucionário é natural que o partido revolucionário tenha uma adesão fora do normal. Isso não significa que os jovens nesta fase não estejam a aderir. Significa só que o momento que nós vivemos não é o mesmo.
Aliás, uma das coisas interessantes que está nas Teses [documento de orientação estratégica para os próximos quatro anos] é o aumento de recrutamentos que se conseguiu, em particular de jovens. Da minha experiência, não há um afastamento da juventude. Pelo contrário, é uma procura de falar e de nos colocarem as injustiças que sentem, assim como uma curiosidade em conhecer a JCP. Diria que não temos razões para estar desanimados.
3. Os estudos mostram uma redução das formas de participação tradicional nas novas gerações. Os jovens trabalhadores de hoje sentem-se representados nos sindicatos ou a diminuição da sindicalização também é um reflexo de que estes não sentem que os seus problemas estão representados nos discursos dos sindicatos?
Acho que não tem que ver com isso. Aliás, no último Congresso da CGTP-IN foram mencionadas as 16 mil novas sindicalizações [segundo a central sindical foram 15.069].
Da experiência da JCP, nos locais de trabalho e no contacto com os jovens trabalhadores, são outras as dificuldades. É o facto de terem trabalhos absolutamente precários, de haver climas de intimidação que os afastam dos sindicatos, de terem contratos que às vezes são de dois meses, às vezes de duas semanas, às vezes não terem contratos de todo.
Em si, a vida que levam dificulta a sua organização, mas a mim parece-me que os jovens trabalhadores têm aspirações que querem ver correspondidas e problemas que querem ver resolvidos. Por isso não me parece que esse seja o cenário. O descontentamento está lá e a verdade é que os únicos que estão lá também, além da JCP do PCP, são os sindicatos.
4. Qual a importância do XXII Congresso do PCP?
Os congressos do PCP são sempre muito importantes, tanto para o PCP como para a JCP, porque significam uma ampla discussão e envolvimento de todos os militantes. Não fazemos o nosso congresso só para eleger ou para vir aqui fazer discursos. Fazemos o congresso para discutirmos o que vamos fazer, como é que vamos reforçar o partido, como é que vamos dar um contributo para o nosso país e para o nosso povo.
Dão força ao nosso partido e inclusive aos militantes da JCP, que estão muito entusiasmados por estar aqui hoje e por terem oportunidade de ouvir também outros camaradas, de poderem aprender. Aliás, a maioria deles estão num congresso do partido pela primeira vez, porque se inscreveram depois do último [que se realizou em 2020].
E é determinante, porque especialmente para a juventude, não há muitos espaços onde nos perguntam efetivamente aquilo que achamos da nossa vida e o que vamos fazer para transformar as coisas.
5. Quais os principais desafios no horizonte do PCP?
São muitos desafios. Aliás, a situação internacional e nacional não aponta necessariamente num sentido positivo, especialmente para a juventude. Por exemplo, neste momento estamos confrontados com uma situação de promoção e escalada da guerra no mundo que coloca grandes desafios, nomeadamente na organização da juventude e do nosso povo para lutar pela paz. Porque no final do dia são sempre os povos que pagam as guerras.
E depois, nos 50 anos do 25 de Abril, especialmente quando tentam deturpar aquilo que foi a Revolução de Abril, é afirmar a Revolução de Abril e aquilo que é a nossa História. É afirmar aquilo que os jovens são capazes quando se unem, se organizam e decidem tomar nas suas mãos os destinos das suas vidas.
6. Será a mais nova no Comité Central. Qual a importância de incluir mais jovens neste órgão?
O Comité Central procura garantir uma ligação da direção do nosso partido à vida. Por alguma razão, tem uma maioria dos operários e trabalhadores [que corresponde] à composição social do nosso país, onde a maioria são os trabalhadores, aqueles que produzem riqueza.
A presença da juventude permite precisamente isso. Permite uma maior ligação e conhecimento da realidade dos jovens do nosso país. É uma grande responsabilidade - tanto para mim como para os outros camaradas da JCP que vão integrar o Comité Central - mas faremos de tudo para garantir essa ligação e que se discute, também nas reuniões do Comité Central, a realidade dos jovens.
7. Carlos Carvalhas defendeu na entrevista à Rádio Renascença que o PCP vai continuar a existir mesmo que desapareça do plano institucional. Porque é que é essencial que o PCP continue a ter representação neste plano?
O PCP tem mais de cem anos e durante grande parte da sua história não teve representação na Assembleia da República. Aliás, foi sem ter essa representação que fez uma revolução. Agora, parece-me naturalmente que andamos para trás e o nosso país recua se isso acontecesse. Os trabalhadores e a juventude perderiam uma voz na Assembleia da República. Estamos cá para tudo. Tenho a confiança que isso não vai acontecer, mas se acontecer um dia, a luta continua e, mais cedo que tarde, conseguiremos cumprir a Revolução de Abril.