
Hoje termina o mandato de Mário Centeno como governador do Banco de Portugal. Numa altura de grande incerteza na economia mundial, o ainda governador falou ao JornalPT50, destacando a importância da estabilidade como valor fundamental do sistema financeiro.
“Os bancos centrais têm um papel fundamental na preservação da estabilidade de preços, essencial ao crescimento económico sustentável. Nesta fase de grande incerteza, em que a probabilidade associada a riscos com impacto negativo sobre o crescimento económico aumentou de forma significativa, este papel estabilizador dos bancos centrais é ainda mais importante”, afirmou.
Para Centeno, “as políticas económicas devem permanecer contra-cíclicas, de modo a preservar capacidade de ação em contextos adversos. Numa fase em que os preços no comércio internacional estão em queda e a economia da área do euro não mostra sinais consistentes de crescimento, a política monetária deve manter-se atenta aos riscos descendentes para a inflação”.
O ainda governador defende maior agilidade por parte do Banco Central Europeu (BCE): “Estando a inflação em 2%, em cada momento e com base nos dados disponíveis, a agilidade e flexibilidade de atuação devem continuar a ser a regra, garantindo a ancoragem da inflação no médio prazo”.
A estabilidade e a independência dos bancos centrais foram também defendidas esta semana pelo presidente do Banco Central Alemão (Bundesbank), Joachim Nagel, que afirmou: “É perigoso brincar com a independência de um banco central”. Ainda assim, o Governo decidiu não reconduzir Centeno na liderança da autoridade de supervisão financeira.
Sem que ainda se conheça o nome do sucessor, Mário Centeno não abandonará em definitivo o organismo. Irá ocupar o cargo de consultor da Administração do Banco de Portugal e participará na reunião do BCE que se realizará nos dias 23 e 24 da próxima semana, onde será discutida a possibilidade — ou não — de uma nova descida das taxas de juro.
Centeno manter-se-á em funções, com todos os poderes de governador intactos, até à tomada de posse do seu sucessor, cuja data ainda não foi anunciada. Entretanto, o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento disse, no final da reunião do Conselho de Ministros nesta sexta-feira, que o nome do futuro governador será conhecido para a semana.
Pela primeira vez, nos últimos 25 anos, um governador do Banco de Portugal não é reconduzido para um segundo mandato. Antes de Centeno, Carlos Costa ocupou o cargo durante 10 anos, tendo transitado da vice-presidência do Banco Europeu de Investimentos (BEI) em 2010. Nomeado pelo Governo socialista de José Sócrates, foi reconduzido pelo Governo PSD/CDS, liderado por Pedro Passos Coelho, em 2015.
O seu mandato foi marcado pela entrada da Troika em Portugal e por alguns dos episódios mais turbulentos da história do sistema financeiro nacional em democracia, nomeadamente as falências do Banco Espírito Santo (BES) e do Banif.
Carlos Costa sucedeu a Vítor Constâncio, o governador com o mandato mais longo à frente do banco central. O ex-ministro das Finanças ocupou o cargo durante 12 anos, divididos em dois períodos: entre 1985 e 1986, e depois entre 2000 e 2010. Constâncio era considerado um homem da casa. Ingressou no Banco de Portugal um ano após a revolução de 25 de Abril e assumiu o cargo de diretor do Departamento de Estatística e Estudos Económicos — precisamente o lugar a que Mário Centeno se candidatou 38 anos depois quando era vice-diretor daquele Departamento.
Quem menos tempo exerceu funções como governador foi Miguel Beleza. Ministro das Finanças no XI Governo Constitucional (liderado por Cavaco Silva), transitou para o Banco de Portugal em 1992, enfrentando o desafio da desvalorização do escudo. Na altura, estavam a ser dados os primeiros passos para a criação do Sistema Monetário Europeu, e procurava-se fixar as paridades entre as várias moedas. “Se me perguntarem o que fiz pelo país, digo que dei um empurrãozinho ao euro”, afirmou publicamente.
Demitiu-se em 1994, em conflito aberto com o então ministro das Finanças, Jorge Braga de Macedo.
A escolha do sucessor de Centeno está sujeita a um conjunto de requisitos estritos, que exclui muitos dos potenciais candidatos ao cargo. Segundo os estatutos do próprio banco, não podem ser designadas como governador, nem como membros do Conselho de Administração, “as pessoas que, nos três anos anteriores à designação, tenham integrado os órgãos sociais, desempenhado quaisquer atividades ou prestado serviços, remunerados ou não, ou detido participações sociais de valor igual ou superior a 2% do capital social, em entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal, ou em cuja supervisão o Banco de Portugal participe no âmbito do Mecanismo Único de Supervisão, ou em empresas ou grupos de empresas que controlem ou sejam controlados por tais entidades, no referido período ou no momento da designação”.
Acresce ainda que não podem ser nomeadas “as pessoas que, nos três anos anteriores à designação, tenham integrado os órgãos sociais, desempenhado quaisquer atividades, ou prestado serviços, remunerados ou não, ou detido participações sociais de valor igual ou superior a 2% do capital social em empresas de auditoria ou consultoria, no referido período ou no momento da designação”.