
Documentos e pertences literários e pessoais de Katherine Mansfield, submetidos pela Nova Zelândia, foram inscritos pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) no programa "Memória do Mundo", tornando-se assim Património Documental da Humanidade.
Katherine Mansfield (1888-1923), pseudónimo de Kathleen Beauchamp, uma das mais importantes escritoras modernistas do mundo, ficou conhecida pela sua poesia, críticas e trabalho como editora de revistas literárias de vanguarda de Londres, mas principalmente pelos seus contos.
As 'coleções Mansfield' incluem correspondência original, cadernos e diários, objetos pessoais, incluindo a sua máquina de escrever e artefactos Maori, documentam as preocupações artísticas, o desenvolvimento e os métodos da escritora, bem como a sua complexa vida pessoal, constituindo "um recurso inestimável para biógrafos, historiadores, críticos literários, académicos e leitores".
Também as escritoras suíças Annemarie Schwarzenbach (1908-1942) e Ella Maillart (1903-1997), pelas suas "visões femininas do mundo", passam a estar contempladas no programa da UNESCO, através das coleções de arquivos que documentam as suas "extraordinárias carreiras".
A coleção Annemarie Schwarzenbach, dos Arquivos Literários Suíços (Berna), reúne uma coleção iconográfica e materiais relacionados com o seu trabalho literário e jornalístico; a coleção Ella Maillart da Biblioteca de Genebra, preserva a maior parte dos seus arquivos manuscritos; e a coleção Ella Maillart do Musée de l'Élysée (Lausanne), reflete o seu trabalho como fotógrafa.
"Estes arquivos oferecem uma visão dos seus processos criativos e servem como testemunhos valiosos dos tempos conturbados que viveram - da Rússia Soviética à Alemanha nazi, passando pela África colonial e pela Ásia Central entre 1930 e 1945", segundo a UNESCO.
Na base desta candidatura esteve o reconhecimento de que a história da escrita de viagens tem muitas vezes ignorado as mulheres, como aconteceu com estas duas escritoras de viagens, pioneiras em domínios dominados pelos homens, que "encarnaram uma forma de inconformismo, infundindo as suas narrativas de viagem com dimensões existenciais e até espirituais".
A Croácia viu ser reconhecida a candidatura das curtas-metragens da Escola de Cinema de Animação de Zagreb (1956 - 1979), um estilo de animação originário do Zagreb Film's Animation Studio, representado através de uma coleção de 414 filmes de animação com uma expressão modernista reconhecível.
Estes filmes foram criados entre 1956 e 1979, um período de declínio do realismo socialista, durante o qual o cinema de animação proporcionou espaço para experiências com a forma e uma maior tolerância para temas provocadores, como as questões existenciais de liberdade humana e ansiedade na sociedade contemporânea, centrando-se no "pequeno homem" como um impotente objeto de manipulação.
Desenhos e escritos de crianças durante o tempo de guerra na Europa (1914-1950) foram também inscritos no programa "Memória do Mundo", na sequência de uma proposta de vários países: Canadá, República Checa, França, Alemanha, Polónia, Espanha, Suíça e Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte.
De acordo com a UNESCO, esta coleção de documentos, desenhos, pinturas e escritos de infância e juventude, juntamente com dois diários de jovens, retrata os principais acontecimentos do "tempo de guerra" e as suas consequências.
"Pela sua criatividade, riqueza de motivos e linguagem direta, estes documentos transcendem as fronteiras nacionais, oferecendo possibilidades de diálogo e compaixão".
Para a UNESCO, trata-se de um "património democrático das culturas urbanas e rurais de toda a Europa, criado por rapazes e raparigas de diferentes idades e classes sociais", que, oferecendo "testemunhos universais de diferentes culturas, proporcionam conhecimentos valiosos para as gerações futuras".
Ma Memória do Mundo foram também inscritos projetos de Angola, Brasil, Cabo Verde e Moçambique, como o arquivo do médico e cientista brasileiro Carlos Chagas, "O Mapa Etno-Histórico de Curt Nimuendaju", sobre povos indígenas no Brasil e regiões vizinhas, "Documentos sobre a Escravatura nos Arquivos da Secretaria-Geral do Governo (Cabo Verde, 1842-1869)" e o "Recenseamento de escravos em Angola, Cabo Verde e Moçambique determinado por decreto português de 14/12/1854".
Entre as novas inscrições está igualmente o legado do filósofo alemão Friedrich Nietzsche.
Criado em 1992, o programa Memória do Mundo da UNESCO visa preservar o património documental da humanidade, promovendo a sua proteção contra o esquecimento, a deterioração e a destruição. É uma instância legitimadora, que reconhece e garante valor a acervos, acionando, nesse processo, várias categorias de especialistas para análise das candidaturas.
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