
Portugal vai passar a contar com um Comité Nacional do Blue Shield – Escudo Azul, estrutura internacional dedicada à protecção do património cultural em situações de conflito armado, catástrofes naturais e riscos resultantes da acção humana. A proposta de criação do comité foi apresentada por Ana Paula Amendoeira e já recebeu autorização do Blue Shield Internacional, organização ligada à UNESCO.
A responsável, actual vice-presidente do ICOMOS Portugal, explicou ao Jornal ODigital.pt que o comité português está ainda em fase de instalação, com os estatutos em preparação e contactos em curso com várias entidades parceiras. «Portugal era um dos poucos países europeus onde ainda não existia este comité. Apresentei uma proposta com conteúdo metodológico e várias cartas de apoio institucionais e a autorização foi concedida», afirmou Ana Paula Amendoeira, que lidera a comissão instaladora.
O Blue Shield nasceu no pós-Segunda Guerra Mundial, na sequência da Convenção da Haia de 1954, com o objectivo de proteger bens culturais em cenários de guerra. «A destruição massiva de cidades e o tráfico e roubo de património durante os conflitos levaram à criação de regras internacionais. Portugal ratificou esta convenção em 2000», recordou a entrevistada.
O comité português terá por missão identificar e prevenir riscos para o património cultural, incluindo não apenas edifícios e monumentos, mas também arquivos, bibliotecas e museus. O trabalho será desenvolvido em articulação com organismos governamentais e não-governamentais. Entre os parceiros esperados estão o Ministério da Cultura, o Ministério da Defesa, a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil, e representantes nacionais de organismos internacionais como o ICOMOS, a IFLA (bibliotecas) e o ICA (arquivos).
«Este comité não responde apenas a cenários de guerra. As alterações climáticas e os erros decorrentes da acção humana são hoje também uma ameaça significativa ao património», referiu Ana Paula Amendoeira. «Temos exemplos concretos em Portugal de destruição de património devido a cheias, vendavais ou fenómenos extremos, e também pela agricultura intensiva, como se tem verificado no Alentejo.»
A acção do comité abrangerá também a formação, a sensibilização e a educação para a prevenção de riscos. «Muitas vezes não aplicamos regras básicas de segurança por desconhecimento ou falta de meios. Este comité pode emitir alertas, partilhar boas práticas e articular respostas eficazes com os diferentes intervenientes», acrescentou.
Em cenários de guerra como a Ucrânia ou Gaza, o Blue Shield Internacional tem desempenhado um papel relevante, procurando salvaguardar património cultural atingido ou ameaçado. «O património é muitas vezes alvo directo dos conflitos, como forma de atingir identidades e culturas. O comité pretende contrariar essa realidade, protegendo o que é essencial para a memória e identidade dos povos», concluiu a responsável.
Apesar de se tratar de uma estrutura nacional, Ana Paula Amendoeira reconheceu que será também dada atenção ao Alentejo, devido à intensidade das transformações da paisagem e à vulnerabilidade do património na região, nomeadamente devido à agricultura intensiva e à instalação de centrais fotovoltaicas.
O Comité Nacional Blue Shield Portugal integrará a rede internacional coordenada pela UNESCO e procurará implementar metodologias de prevenção, mapeamento de riscos e resposta em articulação com as autoridades nacionais e internacionais.