O estudo “Clima de Mudança: Perceções sobre os Desafios Ambientais em Portugal”, encomendado pela Fundação Calouste Gulbenkian à IPSOS Apeme, revela que a maioria dos portugueses reconhece a importância dos desafios ambientais, mas esta preocupação não está entre as suas prioridades diárias – as alterações climáticas surgem em 10º lugar numa lista de 18 temas, refere hoje a Gulbenkian em comunicado.

As suas preocupações direcionam-se mais para questões como os cuidados de saúde ou a pobreza e desigualdade social.

O espaço público também não é visto como um exemplo de boas práticas ambientais, com apenas 21% dos inquiridos a considerar que este reflete compromissos sustentáveis e uma maioria de 65% a concordar que “o espaço público deve liderar pelo exemplo na adoção de práticas mais sustentáveis”.

A perceção de que ser sustentável é financeiramente mais exigente é uma barreira significativa — 52% dos inquiridos refere que não faz mais pelo ambiente porque isso implicaria custos adicionais. Medidas de incentivo, como benefícios financeiros e recompensas, revelam-se assim mais eficazes para estimular mudanças de comportamento do que abordagens punitivas. Quanto aos jovens, os que têm entre os 18 e os 24 anos apresentam os níveis mais baixos de envolvimento com a causa ambiental, em comparação com outras faixas etárias.

Estas são apenas algumas das conclusões do estudo, de âmbito nacional, que procurou não só compreender as atitudes dos cidadãos perante os temas ambientais, mas também perceber como são percecionadas as organizações da sociedade civil na área do ambiente e as principais abordagens que estas seguem para envolver os cidadãos.

A partir do universo de inquiridos e da relação que cada um mantém com o meio ambiente, o estudo permitiu traçar cinco perfis, dividindo os inquiridos por: Entusiastas (25%), indivíduos proativos e motivados, que já adotam práticas sustentáveis; Esforçados (27%), que correspondem a cidadãos comprometidos, mas frustrados com a falta de apoio coletivo; Recetivos (25%), cidadãos interessados, mas inconsistentes nos hábitos; Ocupados (15%), cujo envolvimento é limitado devido às exigências da rotina; e, por fim, Desinteressados (8%), perfil que corresponde a cidadãos sem qualquer interesse ou envolvimento com a causa ambiental. Fazendo uma leitura mais fina dos dados, foi possível concluir que, enquanto os Entusiastas abarcam uma larga maioria de cidadãos entre os 45 e os 60 anos (60%), este perfil apenas abrange 13% de jovens entre os 18 e os 24 anos. É o segmento dos Desinteressados que reúne o maior número de jovens, que revelam estar mais ansiosos com o aumento do custo de vida ou com o desemprego do que com a sustentabilidade ambiental.

O estudo “Clima de Mudança: Perceções sobre os Desafios Ambientais em Portugal” conclui ainda que, de acordo com os perfis traçados, os jovens estão menos ligados à comunidade, isto é, participam menos nas iniciativas do seu bairro, e estão menos orientados para a adoção de rotinas mais sustentáveis.

A análise revela que os portugueses reconhecem a importância dos desafios ambientais (71%) e concordam que se as pessoas “não agirem agora para combater as alterações climáticas, estarão a falhar para com as gerações futuras”). 83% dos inquiridos está consciente de que poderia fazer mais em prol do ambiente mas estas preocupações não estão no topo das suas prioridades: numa lista de 18 temas “preocupantes”, as alterações climáticas surgem em 10º lugar, sendo dada primazia a questões como os cuidados de saúde ou a pobreza e desigualdade sociais e a corrupção.  As ameaças contra o ambiente surgem ainda depois, em 14º lugar da tabela de preocupações.

Entre os fatores que dificultam a adoção de comportamentos sustentáveis por parte dos cidadãos destacam-se os custos associados e a ausência de alternativas acessíveis. Cerca de metade dos cidadãos inquiridos afirma que medidas de incentivo, como benefícios financeiros ou recompensas, poderão ser mais eficazes do que abordagens punitivas, como multas ou impostos.

No que respeita ao trabalho das Organizações Não-Governamentais de Ambiente (ONGA), 41% dos inquiridos afirma depender em exclusivo de trabalho voluntário, e apenas 24% considera comunicar eficazmente o seu trabalho. E embora a participação ativa dos cidadãos nestas estruturas continue a ser reduzida, o seu papel é reconhecido pela população. Os resultados revelam que as organizações ambientais mais capacitadas, que já têm o compromisso com a sustentabilidade no centro da sua ação e uma maior proximidade das pessoas e dos seus contextos, podem ser a força motriz da mudança, sendo capazes de convocar autarquias, empresas, escolas, espaços de cultura, comunicação social e cidadãos para concretizar uma visão conjunta de transição e uma mudança sistémica.

Filipa Dias, investigadora da IPSOS Apeme e autora do estudo, refere que “A adesão a um modo de vida mais sustentável não se faz por decreto, pelo que se é essencial educar, não é menos importante demonstrar que essas mudanças necessárias são  benéficas, antes de mais, para as pessoas.  Nesse propósito o espaço público tem de ser ‘montra’ dessas alternativas, em proximidade, e garantir que a nova realidade que se ambiciona é positiva para os portugueses. Para dar um exemplo, não basta promover os transportes públicos, importa assegurar que são uma alternativa de confiança para os compromissos diários das pessoas ou que o traçado das ciclovias ‘entende’ e protege quem anda de bicicleta”.

Para Cristina Casalinho, administradora da Fundação Calouste Gulbenkian, “Alterações climáticas, oceano, biodiversidade ou economia circular são temas cruciais para o futuro da vida humana na Terra, criando importantes desafios ao nível de mudança de comportamentos de cidadãos, autoridades, empresas e organizações da sociedade civil. Por isso, importa investir na produção de conhecimento sobre as perceções dominantes e adotar abordagens que mobilizem toda a sociedade para a transição, com a consciência de que tem de ser justa, buscando soluções ambiental, social e economicamente eficientes, ou seja, sustentáveis.”