
Como seria de esperar de uma cidade que foi disputada por vários poderes, Lisboa não deixou de contar com várias fortificações para a sua defesa ao longo da História. A primeira das muralhas foi durante muito tempo conhecida por cerca moura – “moura” quase como sinónimo, em determinado período, de todas as coisas que se sabe ser de grande mas indefinida antiguidade. Até que se começou a tornar cada vez mais claro que a velha cerca moura poderia ser afinal da Antiguidade tardia, nomeadamente do período de instabilidade que marcou a queda do Império Romano (século V).
Foi só nas últimas décadas que se comprovou, através da Arqueologia, que alguns panos da muralha –nomeadamente os que se encontram dentro de alguns edifícios da zona do Campo das Cebolas e da Casa dos Bicos, à beira rio – foram erigidos durante o próprio domínio romano da cidade, que então se chamava Olisipo. Ainda não se sabe se com funções defensivas ou meramente simbólicas.
Ao delimitarem o espaço, as muralhas sempre tiveram um lado funcional (o da defesa), mas também o de marcar o fora e o dentro, o campo e a cidade, a zona “industrial” – que nos tempos romanos podia ser o porto ou as cetárias de salga de peixe que tornavam Lisboa tão apetecível – e a zona urbana propriamente dita, com templos, edifícios públicos e o espaço de residência das elites.
Dessa cerca, agora rebatizada de “cerca velha”, restam alguns troços ao longo da colina do castelo de São Jorge, mas sobretudo uma memória da sua passagem no formato das ruas, na largura inesperada de algumas praças, na delimitação dos bairros.
Aquela que é considerada a segunda muralha da cidade teve uma vida curta: surgiu no momento de afirmação do primeiro rei, D. Dinis, que contava já com o território português consolidado e consagrou Lisboa, cada vez mais, como cabeça do seu reinado. A muralha da Ribeira ou dionisina marcou o momento de crescimento da Baixa como novo polo de desenvolvimento da cidade. Um troço desta construção pode ser visitada na antiga igreja de S. Julião, atualmente o Museu do Dinheiro.
O terceiro sistema defensivo da cidade é também o mais extenso e o mais bem documentado, mas não necessariamente o mais bem protegido. Fez parte de um esforço coletivo de proteção contra as ameaças de Henrique II de Castela e foi construída durante a década de 1370 e 1380, bem a tempo da crise dinástica de 1383-85. Conteve com sucesso um cerco castelhano que durou meses. Envolve a cidade desde o atual Bairro Alto até ao Bairro da Graça. Ao longo dos tempos foi sendo engolida pelas novas edificações, aos poucos desmantelada para dar passagem ao progresso, aos coches e aos automóveis.
O 1º episódio da segunda temporada das Histórias de Lisboa dá atenção a um elemento essencial para compreender a geografia e a evolução da cidade ao longos séculos: as muralhas de Lisboa!
Histórias de Lisboa é um podcast semanal do jornalista da SIC Miguel Franco de Andrade com sonoplastia de Salomé Rita e genérico de Nuno Rosa e Maria Antónia Mendes.
A capa é de Tiago Pereira Santos em azulejo da cozinha do Museu da Cidade - Palácio Pimenta.
Ouça aqui as ‘Histórias de Lisboa’: