O PS em qualquer eleição presidencial tem uma responsabilidade acrescida na escolha do candidato que apoia. A razão é óbvia. O Partido Socialista ofereceu ao país os dois melhores presidentes da sua história: Mário Soares e Jorge Sampaio.
Para 2026, os candidatos óbvios e naturais do PS, António Guterres e António Costa, tamanha a respeitabilidade internacional que alcançaram e os cargos que ocupam, estão indisponíveis. Por essa indisponibilidade, a escolha entre dois “Antónios” — Costa e Guterres — transformou-se, ironia do destino, na escolha entre outros dois — Seguro e Vitorino.
Pedro Nuno Santos tem, por isso, uma tarefa ingrata que nenhum socialista gostaria de ter: a de escolher entre os seus camaradas o mais merecedor do apoio do partido para uma candidatura ao lugar mais importante do país. Mais do que escolher, Pedro Nuno deve conduzir o processo de maneira a que, no fim, haja apenas um socialista a concorrer.
Ora, o líder do PS, no concreto, tem sorte e tem azar. Sorte, pois Seguro e Vitorino são ambos personalidades de extraordinário valor e respeitabilidade perante a sociedade portuguesa, que conhecem o país e o PS. Já o azar tem-no exatamente pela mesma razão.
Quanto a mim, ficaria muito satisfeito em poder votar em António José Seguro. Não porque não o gostasse de fazer em António Vitorino, mas porque penso que Seguro tem mais condições, na atual conjuntura, de vingar e garantir que o próximo Presidente da República é alguém do centro-esquerda reformista, e que tem demonstrado ao longo do seu percurso ser fortemente comprometido com a reforma do sistema democrático.
Já defendi, num artigo publicado também no Expresso, a necessidade de se alcançar consensos e pontes em áreas fundamentais da vida política do país. Neste sentido, acredito que o Presidente da República, não tem tido, mas pode e deve ter um papel fundamentalpara que as mesmas se façam. António José Seguro é aquele que, a meu ver, pode garantir que as reformas que o país precisa sejam feitas, com linhas vermelhas bem traçadas, mas com compromissos firmes que unam as forças democráticas. Pelo menos, é dos poucos que o tem abertamente defendido.
No PS, muitas são as dúvidas. Umas mais justas e válidas, outras menos e mais emotivas, apesar de a grande guerra, as Primárias de 2014, se ter dado já há mais de dez anos. Quanto às válidas, as que merecem ser comentadas, percebo que o percurso político de Seguro pode não fazer com que os socialistas se lembrem dele como um engenhoso da política-espetáculo, nem como um tenaz e fervoroso combatente da direita. No entanto, não é isso que está em causa nesta eleição. Considero que mais importante é o facto quase indiscutível de ser conhecido, não só pelos socialistas, mas, sobretudo, pelos portugueses, como um homem reto, coerente e capaz de diálogos.
Seguro afirmou, também, outro ponto chave que tem de estar marcado no próximo inquilino de Belém — o compromisso e preocupação com a governabilidade. Num país que cada vez é menos bipartidarizado, é preocupante que os governos venham a ver-se na inevitabilidade de andarem sempre a marcar passo, na ansiedade da possibilidade de eleições antecipadas. O quadro de uma democracia parlamentar tem de nos permitir amadurecer o nosso regime no sentido de, aquando de vicissitudes como o chumbo de um orçamento ou a queda de um governo, se conseguir encontrar soluções no contexto parlamentar eleito, em primeira instância.
Apesar do que se pudesse pensar, não reapareceu sem se ter reinventado. Nesta sua reencarnação política, agradou-me que tenha percebido que tinha de estar nas redes sociais e que tinha de inovar e refrescar, mas também que aparecesse livre, independente de qualquer bênção que outros achem que precisaria. Os homens livres falam quando querem falar, e calam-se quando entendem calar-se. Seguro durante muitos anos quis estar calado, não comprometendo, nem condicionando, aliás, a liderança de António Costa. Não quis ser líder de fação e, entretanto, foi professor e empresário. Agora decidiu voltar a intervir e é legítimo que tenha a ambição de querer ser Presidente da República.
Para isso, teve a iniciativa de não esperar por ninguém para voltar a divulgar o que pensa sobre o país regularmente, e, não escondendo as suas origens, soube perceber e agir no pressuposto de que uma candidatura presidencial nunca se poderia esgotar nas paredes de um partido, nem que seja o seu, que tão bem conhece e que já liderou.
Por outro lado, o PS não pode encher comícios com vénias a Mário Soares pela coragem, liberdade e abnegação com que enfrentou o cenário adverso das sondagens de 1986, e, passado um mês, condicionar a escolha do seu candidato precisamente às sondagens. No entanto, ainda, neste aspeto, apesar de muitos terem vaticinado infundadamente que Seguro apareceria dentro dos candidatos do PS como o mais mal posicionado, o mesmo não se verificou. A sondagem do ICS e do ISCTE, publicada pelo Expresso, coloca-o mesmo como o candidato mais bem posicionado da área socialista, após a desistência de Mário Centeno, que surgia com 17% no trabalho de campo da mesma sondagem.
Ora, verificado este facto, mais relevante do que Seguro aparecer à frente na sondagem é a margem de progressão que a análise da situação política nos permite atribuir-lhe.
Quanto a isto, penso também que é o mais capaz de alcançar os votos dos indecisos, uma vez que tem o que os portugueses têm mostrado querer no seu chefe de Estado. Seguro é moderado, mas convicto, intrasigente nos príncipios mas dialogante e, sobretudo, sempre digno na sua atuação. Estas características são as que me parecem mais importantes para, ao centro, batalhar eleitoralmente com Gouveia e Melo e Marques Mendes.
Depois de dez anos de uma presidência inconstante, folclórica e que não deu garantias de estabilidade, os portugueses vão querer mudar. O trocadilho é inevitável — vão querer jogar pelo Seguro e eleger alguém com o perfil ponderado que lhe conhecemos.
Ao dia de hoje, não há nenhuma razão séria e objetiva para que o Partido Socialista não decida por António José Seguro. Se o vai ou não fazer, só o futuro dirá. Mas que devia, devia.