Numa reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU) convocada pelos Estados Unidos da América (EUA) para discutir os efeitos da guerra sobre as crianças na Ucrânia, a embaixadora norte-americana junto da organização recordou que as forças russas são acusadas de "roubarem crianças ucranianas" e de as enviarem para territórios ocupados por Moscovo ou as deportarem para a própria Rússia, "onde todos os vestígios delas são frequentemente obscurecidos".

"As forças da Rússia atribuíram a essas crianças ucranianas novos nomes russos, passaportes russos e submeteram-nas a programas russos de doutrinação 'militar-patriótica'. Puniram crianças por falar ucraniano, mentiram-lhes sobre o destino das suas famílias e comunidades e forçaram-nas a adoções com famílias russas", denunciou Linda Thomas-Greenfield.

"Noutras palavras, a Rússia tem procurado sistematicamente apagar a identidade dessas crianças", acusou.

Em março, o Tribunal Penal Internacional (TPI) emitiu mandados de captura contra o Presidente russo, Vladimir Putin, e a sua comissária para a proteção das crianças, Maria Lvova-Belova, pela deportação em massa de menores ucranianos das zonas ocupadas da Ucrânia para território russo, o que constitui um crime de guerra.

Além disso, a Rússia surge no relatório anual do secretário-geral da ONU sobre Crianças e Conflitos Armados, nomeadamente por violações contra menores, incluindo assassínios e mutilações e ataques a escolas e hospitais, sublinhou Linda Thomas-Greenfield no encontro.

Nesse sentido, os EUA assumiram continuar empenhados em pressionar pelo retorno seguro das crianças ucranianas e em obter responsabilização, tendo a embaixadora norte-americana anunciado que o Departamento de Estado aplicará restrições de visto a "mais cinco autoridades apoiadas ou instaladas pela Rússia, pelo seu envolvimento em abusos de direitos humanos de crianças ucranianas em conexão com sua deportação, transferência e confinamento forçados".

Na reunião de hoje esteve também presente Nathaniel Raymond, em representação da Escola de Saúde Pública de Yale, instituição que na terça-feira divulgou um estudo que aponta que a Rússia submeteu pelo menos 314 crianças ucranianas a um programa de adoção forçada desde o início da guerra, em fevereiro de 2022.

A investigação identificou 166 crianças já adotadas por cidadãos russos e outras 148 inscritas em bases de dados dirigidas pelo Governo russo, como parte de uma operação "sistemática, intencional e generalizada" e que é descrita como uma tentativa de "russificação" dos menores.

Numa visão mais ampla sobre o efeito da guerra nas crianças ucranianas, a diretora executiva do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Catherine Russell, indicou que foram registadas mais vítimas infantis durante os primeiros nove meses deste ano do que durante todo o ano de 2023.

No total, a ONU verificou que pelo menos 2.406 crianças foram mortas ou feridas desde fevereiro de 2022 -- início da invasão russa em grande escala -, numa média de duas crianças por dia.

"Esses são apenas os números verificados pela ONU. Sabemos que o número real é muito maior", admitiu Catherine Russell.

"Na Ucrânia, a guerra está a destruir a vida das crianças. Ela forçou muitas famílias e crianças a uma vida subterrânea devido ao risco contínuo de ataques. As crianças passam até seis horas todos os dias abrigadas em porões e outros espaços húmidos e escuros sob sirenes de ataque aéreo estridentes, temendo pelas suas vidas", sublinhou a líder da UNICEF.

Ainda na reunião de hoje, a Ucrânia fez-se representar por Daria Zarivna, a diretora de operações da 'Bring Kids Back', iniciativa do Governo ucraniano que visa recuperar as crianças ucranianas deportadas e transferidas à força pela Rússia, e que afirmou que "um dos capítulos mais horríveis e horripilantes" da invasão russa são os crimes contra crianças ucranianas, incluindo "assassínios, tortura, violência sexual, assim como a destruição da vida familiar, lares, escolas e da segurança".

Presente na mesma reunião, o embaixador russo junto da ONU, Vasily Nebenzya, argumentou que as ações de Moscovo representam uma retirada humanitária de crianças de zonas de conflito em conformidade com a lei internacional de direitos humanos, justificação que foi duramente criticada por Kiev.

 

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