"Quem conhece bem a arte de Malangatana, vai conseguir ver os traços", nas ilustrações do conto "Nina", de Vanda Azuaga Monteiro, título vencedor da 1.ª edição do Prémio Literário Infantojuvenil Manuel Lopes, anunciado em agosto de 2024, iniciativa da Casa da Moeda (INCM) e Instituto da Biblioteca Nacional de Cabo Verde (BNCV).

Quando foi publicado o anúncio a abrir concurso para ilustrar a história premiada, Wilson Lopes avançou: pegou no conto e percebeu que não era obra para acompanhar com o seu estilo favorito, manga, de origem japonesa.

"Então inspirei-me num artista de que gosto muito, Malangatana", que conheceu pelas imagens que um moçambicano lhe mostrava, numa firma para a qual já trabalhou.

Wilson, também conhecido como Tozé, adaptou o estilo, teve de "filtrar" a expressão mais crua e explicita do artista plástico do Índico e "trazê-la para o mundo infantil", em ilustrações que, em breve, deverão ser conhecidas e publicadas.

"Uma dificuldade em ser ilustrador em Cabo Verde é ter trabalho, especialmente como 'freelancer'. Normalmente, optamos por procurar emprego fora", descreve à Lusa.

"O mercado interno é mais pequeno", refere, enquanto monta a mesa digitalizadora, ligada a um computador, em que começa a desenhar uma personagem, rapidamente, com uma caneta especial.

Atualmente, 65% das bandas desenhadas que faz são encomendadas por autores portugueses, entre outros, a quem envia o currículo e o portefólio digital ou que o conhecem através do passa-a-palavra no meio.

Mas o sonho de Wilson é publicar a sua própria coleção de banda desenhada, contar as suas próprias histórias, um objetivo que o Prémio Literário Infantojuvenil Manuel Lopes, na categoria de ilustração, pode ajudar a conquistar -- a distinção inclui uma componente pecuniária de cinco mil euros (repartida equitativamente entre as categorias de texto e ilustração) e a edição em livro dos trabalhos vencedores.

O ilustrador nasceu na Praia, capital cabo-verdiana, e diz que desenha desde que se lembra que é gente, sempre incentivado pela mãe - foi o único, entre cinco irmãos, que se manteve a trabalhar no ramo artístico.

Começou por desenhar personagens, cenários e animações para jogos de computador, depois dedicou-se ao trabalho de retratista, até que a ilustração e banda desenhada começaram a ocupar-lhe mais tempo.

Wilson Lopes espera conquistar notoriedade para dar vida a cinco personagens que já esboçou e que mostra, guardadas no computador, à espera que um dia ganhem vida. 

"Três delas são crianças" que soltam a imaginação e têm aventuras em jardins que lhes parecem florestas, em árvores que, na banda desenhada, se transformam em naves espaciais, com extraterrestres, descreve, enquanto percorre as páginas no computador.

A imaginação é ferramenta e alimento, num país onde "não há formação académica" no ramo das artes, lamenta.

"Quando gostamos de uma coisa, tentamos, seguimos até ao fim", bebendo de diferentes fontes de inspiração e experiência, como Tutu Sousa ou Aires Melo, entre outros artistas plásticos.

"Mas penso que o terreno está a ser arado" e no futuro pode dar frutos. 

O ilustrador fecha o computador para mostrar outro dos seus trabalhos, mas que está exposto no exterior: um mural na fachada traseira de um edifício privado do Plateau, centro histórico da capital cabo-verdiana.

"Este foi mais difícil de fazer", reconhece, olhando da Praça Alexandre Albuquerque para a parede de 15 metros de altura onde andou, durante um mês, pendurado num andaime, a pintar retratos, entre temas como música e crianças do futuro -- um trabalho em parceria com Délio Leite.

Lá no alto, é mais complicado de manter a perspetiva daquilo que se desenha, explica. 

Apesar da exposição pública de trabalhos como este, o seu sonho permanece: dar vida às histórias e personagens que já esboçou no computador.

LFO // VM

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