Desde o aeroporto à declaração de Ivo Rosa, dos recursos e contrarrecursos de ambas as partes, das suspeitas às acusações: 11 anos de um processo que levará o antigo primeiro-ministro a julgamento. Esta segunda-feira sabe-se quando começará Sócrates a responder perante a Justiça

Ainda não é o dia D - esse será o da sentença de um eventual julgamento - mas o dia 25 de janeiro de 2024 ficará para a história da Operação Marquês. A Relação decidiu os crimes pelos quais os 28 arguidos vão responder, incluindo os 22 pelos quais será julgado Sócrates, três deles por corrupção. Ainda é possível um recurso para o Constitucional, mas será muito improvável que esta decisão seja mudada.
Esta segunda-feira será outro dia importante: vai saber-se quando começa o julgamento. Siga em baixo a cronologia dos acontecimentos.
2014
21 de novembro:
- José Sócrates é detido na manga de um avião no aeroporto de Lisboa. Tinha aterrado num voo proveniente de Paris e o advogado - o entretanto falecido João Araújo - tinha-o avisado de que corria esse risco.
- A Procuradoria-Geral da República (PGR) confirma que o ex-primeiro-ministro e outras três pessoas foram detidas por ordem do procurador Rosário Teixeira, do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP). Em causa estavam os crimes de “fraude fiscal, branqueamento de capitais e corrupção”.
22 de novembro:
- Os outros detidos são o empresário Carlos Santos Silva, o advogado Gonçalo Trindade Ferreira e o motorista de José Sócrates, João Perna, que viria a ser julgado por posse de arma proibida.
- O inquérito teve origem “numa comunicação bancária” feita ao DCIAP em cumprimento da lei de prevenção e repressão de branqueamento de capitais.
24 de novembro:
- O juiz Carlos Alexandre decreta prisão preventiva ao ex-primeiro ministro (ex-PM), ao seu motorista e a Carlos Santos Silva por suspeitas de crime económicos. Perna viria a ser acusado e julgado por posse de arma proibida.
26 de novembro:
- O ex-Presidente da República Mário Soares (falecido em 2017) é o primeiro político a visitar Sócrates na cadeia de Évora e considera que o ex-PM está a ser vítima de “um caso político” e de “uma campanha que é uma infâmia”.
2015
24 de fevereiro:
- Alexandre decide manter José Sócrates e Carlos Santos Silva em prisão preventiva.
- João Perna vê a medida de coação de prisão domiciliária ser alterada para liberdade provisória, mediante apresentação semanal à autoridade policial.
22 de abril:
- Joaquim Barroca, administrador do Grupo Lena, fica em prisão preventiva.
22 de maio:
- Carlos Santos Silva passa de prisão preventiva para domiciliária, com pulseira eletrónica
8 de junho:
- Sócrates recusa a proposta do MP para ficar a aguardar o desenrolar do processo em prisão domiciliária. Prefere ficar na cadeia de Évora a ter de usar uma pulseira.
30 de junho:
- José Sócrates reivindica a condição de preso político e atribui a sua prisão a uma tentativa de impedir a vitória do PS nas legislativas.
4 de setembro:
- Sócrates passa para prisão domiciliária depois de 288 dias detido em Évora, cadeia reservada a agentes da autoridade e a políticos, como Armando Vara. Fica sem pulseira e com um polícia à porta.
16 de outubro:
- José Sócrates é libertado, mas fica proibido de se ausentar de Portugal e de contactar outros arguidos.
- Carlos Santos Silva deixa de estar em prisão domiciliária.
2016
30 de março:
- O diretor do DCIAP, Amadeu Guerra, fixa para 15 de setembro desse ano o prazo limite para a conclusão do inquérito da Operação Marquês.
21 de abril:
- A ex-mulher de José Sócrates, Sofia Fava, é constituída arguida por suspeitas de fraude fiscal e branqueamento de capitais.
14 de julho:
- O MP realiza buscas a sociedades do grupo PT, residências de antigos gestores da empresa e a um escritório de advogados, estando em investigação crimes de corrupção, fraude fiscal e branqueamento de capitais.
14 de setembro
- A PGR informa que concedeu mais 180 dias para a “realização de todas as diligências de investigação consideradas imprescindíveis”, fixando o prazo em 17 de março.
17 de setembro:
- O juiz Carlos Alexandre diz, em entrevista ao Expresso, acreditar que o querem afastar do cargo que ocupa, nomeadamente arguidos dos casos que tem em mãos.
27 de setembro:
- O CSM recebe uma queixa de José Sócrates contra o juiz Carlos Alexandre.
11 de outubro:
- O TRL rejeita o pedido de afastamento do juiz Carlos Alexandre apresentado pela defesa de Sócrates, por o considerar “infundado”.
22 de dezembro:
- A PGR decide manter o prazo de 17 março para terminar a investigação.
2017
14 de janeiro:
- O empresário luso-angolano Hélder Bataglia apresenta-se voluntariamente no MP para um interrogatório complementar.
18 de janeiro:
- O ex-presidente do BES Ricardo Salgado é interrogado pelo MP depois de ter sido constituído arguido por suspeitas de corrupção, abuso de confiança, tráfico de influência, branqueamento e fraude fiscal qualificada, ficando impedido de se ausentar para o estrangeiro sem autorização prévia e proibido de contactar com os outros arguidos do processo.
24 de fevereiro:
- Os antigos gestores da Portugal Telecom Henrique Granadeiro e Zeinal Bava são arguidos por suspeitas de fraude fiscal, corrupção passiva e branqueamento de capitais.
7 de março:
- O administrador do Grupo Lena Joaquim Paulo da Conceição e a empresa Lena SGPS são arguidos.
15 de março:
- Os procuradores solicitam à PGR pelo menos mais dois meses para concluir a investigação.
17 de março:
- A PGR anuncia a constituição de 28 arguidos e decide prolongar o prazo de investigação.
27 de abril:
- A PGR decide prorrogar por três meses o prazo para conclusão do inquérito da Operação Marquês, a contar da data de junção ao processo da última carta rogatória a ser devolvida.
11 de outubro:
- O MP acusa José Sócrates de corrupção passiva de titular de cargo político, 16 de branqueamento de capitais, nove de falsificação de documentos e três de fraude fiscal qualificada.
- Uma nota da Procuradoria dá conta da acusação dos 28 arguidos por um total de 189 crimes, e indica que o Carlos Santos Silva foi acusado de 33 crimes, entre os quais corrupção passiva de titular de cargo político, corrupção ativa de titular de cargo político, branqueamento de capitais, falsificação de documento, fraude fiscal e fraude fiscal qualificada.
- O banqueiro Ricardo Salgado é acusado de 21 crimes: corrupção ativa de titular de cargo político, corrupção ativa, branqueamento de capitais, abuso de confiança, falsificação de documento e fraude fiscal qualificada.
- O antigo presidente da PT Zeinal Bava está acusado de cinco crimes de corrupção passiva, branqueamento de capitais, falsificação de documento e fraude fiscal qualificada.
- Henrique Granadeiro, ex-administrador da PT, está acusado de corrupção passiva (um crime), branqueamento de capitais (dois), peculato (um), abuso de confiança (um) e fraude fiscal qualificada (três).
- O ex-ministro e antigo administrador da CGD Armando Vara é acusado de corrupção passiva de titular de cargo político (um), branqueamento de capitais (dois) e fraude fiscal qualificada (dois).
14 de outubro:
- Sócrates classifica as acusações do MP como “um lamaçal de vitupérios”.
2018
4 de maio:
- José Sócrates anuncia que pediu a desfiliação do Partido Socialista para acabar com um “embaraço mútuo”.
2019
16 de janeiro:
- O ex-ministro Armando Vara começa a cumprir cinco anos de pena de prisão na cadeia de Évora no âmbito do processo Face Oculta.
4 de novembro:
- Termina o interrogatório de Sócrates, que durou cinco dias, com o arguido a reiterar que a acusação é “monstruosa, injusta e completamente absurda”, e que mantém o mesmo espírito de repor a verdade para que não fique “pedra sobre pedra” da acusação.
28 de novembro:
- Carlos Santos Silva diz que o cofre com 200 mil euros alugado em nome do seu advogado e também arguido Gonçalo Trindade Ferreira era seu. O engenheiro da Covilhã diz que não conhecia o banqueiro Ricardo Salgado e insiste que a casa de Paris, onde Sócrates viveu dois anos para estudar, lhe pertencia e que a tinha emprestado ao amigo.
29 de novembro:
- Carlos Santos Silva afirma que durante vários anos emprestou 510 mil euros a Sócrates e que desconhecia em que é que o amigo gastava o dinheiro.
2020
5 de março:
- O procurador Rosário Teixeira pede para que todos os 28 arguidos sejam julgados, após mais de quatro horas e meia de alegações, justificando que evitaria a desconfiança dos cidadãos na igualdade de tratamento perante a Justiça.
1 de julho:
- A defesa de Sócrates refuta os atos de corrupção que são imputados ao ex-PM, reiterando que o processo tem uma “motivação política” e que o MP inventou indícios e não quis ouvir explicações sobre factos e sobre a perceção dos negócios.
2021
9 de abril
- O juiz Ivo Rosa anuncia a decisão que reduz a cacos a acusação do Ministério Público. Sócrates é pronunciado pelos crimes de branqueamento e falsificação, mas os crimes de corrupção desaparecem. Carlos Santos Silva, que na tese do MP era o testa de ferro de Sócrates, passa a ser o corruptor para ato não determinado, já prescrito. Zeinal Bava, Sofia Fava, Henrique Granadeiro, Joaquim Barroca, Helder Bataglia, Rui Mão de Ferro e Gonçalo Trindade escapam ao julgamento.
- Rosa arquivou 172 dos 189 crimes de que os arguidos estavam acusados
13 julho
- Vara é o primeiro a ser julgado e é condenado a dois anos e meio de prisão por branqueamento de capitais. Já tinha sido condenado no processo Face Oculta e teve de cumprir cerca de cinco anos de prisão.
2022
7 março:
- Ricardo Salgado é condenado a seis anos de prisão por abuso de confiança. O tribunal admite que o ex-banqueiro sofre de Alzheimer, mas entende que isso não afeta a sua defesa. O Tribunal da Relação de Lisboa irá agravar a pena em mais dois anos. Salgado recorreu e está em liberdade.
2023
Abril:
- O Tribunal da Relação de Lisboa dá razão a um recurso de Sócrates e dá-lhe um prazo de 120 dias para arguir nulidades da decisão instrutória de Ivo Rosa, o que tinha sido negado por este juiz de instrução. Como consequência, os crimes de falsificação estão condenados à prescrição.
2024
25 janeiro:
- O Tribunal da Relação de Lisboa repõe grande parte da acusação e todos os 28 arguidos vão a julgamento. Sócrates será julgado por 22 crimes, incluindo três de corrupção.
1 de fevereiro:
- A defesa do Sócrates considera que a decisão do TRL é nula e reclama a redistribuição a um novo coletivo de juízes, justificando que duas das três juízas responsáveis pelo acórdão deixaram de pertencer à Relação de Lisboa em setembro - ao mudarem para as instâncias do Porto e de Guimarães, no âmbito do movimento de magistrados -, pelo que não teriam competência para assinar aquela decisão.
21 de março:
- O TRL declara nula a decisão do juiz de instrução Ivo Rosa que pronuncia José Sócrates e Carlos Santos Silva pela prática de três crimes de branqueamento e de falsificação de documentos, remetendo o processo ao tribunal de instrução criminal para que seja proferida uma nova decisão instrutória.
16 de abril:
- O CSM rejeita o pedido da defesa de Sócrates para impugnar o coletivo de juízes do TRL que o pronunciou em janeiro por corrupção, branqueamento e fraude.
2 de maio:
- O TRL declara “totalmente improcedentes” os requerimentos da defesa de José Sócrates a invocar impedimentos e incompetência de duas juízas desembargadoras que proferiam o acórdão, validando a decisão de julgar o ex-PM por corrupção, branqueamento e fraude.
16 de maio:
- O STJ recusa o pedido de Sócrates para afastar as juízas Raquel Lima e Madalena Caldeira.
5 de novembro:
- José Sócrates deixa de estar obrigado a apresentações quinzenais na esquadra, após a extinção da medida de coação em 01 de novembro.
20 de novembro:
- José Sócrates viu mais uma reclamação para o TRL rejeitada, numa decisão que os juízes acusam o ex-primeiro-ministro de tentar “protelar de forma manifestamente abusiva e ostensiva” a ida a julgamento.
21 de novembro:
- O Conselho Superior da Magistratura anuncia a criação de um grupo de trabalho para acompanhar e acelerar a tramitação da ‘Operação Marquês’”
28 de novembro:
- O Supremo Tribunal de Justiça rejeita o pedido de José Sócrates para afastar do processo os desembargadores da Relação de Lisboa Francisco Henriques e Adelina Barradas de Oliveira e determina o regresso imediato do processo à Relação de Lisboa para ser imediatamente executado.
6 de dezembro:
- O Tribunal da Relação de Lisboa remete o processo Operação Marquês para julgamento.
9 de dezembro:
- O Tribunal da Relação de Lisboa corrige o despacho que remetia o processo imediatamente para julgamento e determina o envio ao Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), que o enviará para distribuição no Tribunal Central Criminal de Lisboa.
10 de dezembro:
- A juíza Sofia Marinho Pires, do TCIC, envia o processo para o tribunal de julgamento, um dia depois de o ter recebido da Relação de Lisboa.
11 de dezembro:
- O julgamento é distribuído à juíza Susana Seca.
2025
29 de janeiro:
- O STJ nega um recurso pendente do primo de José Sócrates, José Paulo Pinto de Sousa, que poderia ter efeito suspensivo sobre o processo e atrasar o início do julgamento.
3 de fevereiro:
- É noticiado um despacho da juíza titular do processo que agenda para 17 de março pelas 10:00 uma reunião no Tribunal Central Criminal de Lisboa para decidir a data de arranque do julgamento.
12 de fevereiro:
- A Comarca de Lisboa confirma que o julgamento vai decorrer no Campus de Justiça.
6 de março:
- A juíza Susana Seca declara urgência à tramitação dos autos do processo e rejeita um requerimento do Ministério Público para julgar em separado os factos relativos ao empreendimento de luxo Vale do Lobo, no Algarve.