
Reeducação Postural e Pilates vêm-se assumindo como polos fundamentais da relação “terapêutica” que comunica ambos os pacientes, o clínico e o doente, com o seu “pathos” tornado “dor”. Esta é, na verdade, a manifestação “positiva” que a realidade do paciente obsta ao próprio excesso terapêutico, o qual implica a transformação do alongamento na contratura que encima, inflama, os papéis dos envolvidos 1.
Que todo o terapeuta seja, essencialmente, neurótico, “dual”, isso não implica que a compensação “paciente” não possa obter-se, despolarizando Sujeito e Objecto, na concorrência para a Unidade, num estado de “racionalidade libidinal” 2, incestuosa. Jaz, aqui, no Objecto, o perigo de se perder a objetividade clínica. Esse é o papel da dualidade terapêutica, da relação equilibrada entre o comprimento miofascial “posterior” e da força “anterior”. É a ameaça empírica que produz o excesso capaz de polarizar o terapeuta no paciente “real”, ora tornado Sujeito “defensivo”, plexo de deformação que, sociologicamente, atrai outros “sujeitos” duais, com o “objeto” de dirimir o “pathos”. Este equilíbrio novel reorienta a relação “Razão – Realidade”, fragilizando o novo paciente, ex-terapeuta, que, entretanto, vai identicamente defender-se, contrair-se. Esta circularidade põe, bem vendo, em relação perpétua a Razão com a Realidade, o Sujeito com o Objeto, gerando, progressivamente, mais “tónus” no Sistema. A necessária tolerância, equilibração, deve, entretanto, fazer-se no sentido da realidade dominante, da “Physis”, o mal menor, maior garantia de cientificidade.
Que a Razão queira submeter a Realidade, podendo desenhar novel “Domus”, esse é o intento do novo equilíbrio despolarizador. E é também ele a justiça de outra razão. O Domínio representa a preferência da Realidade. Mas a pacificação fenoménica só pode sobressair se o “pathos” for negociado com a tolerância necessária, se bem que é aquele que garante a mudança, a transformação, a qual busca sua intrínseca inDeterminidade.
A última é a postura racional e ela será tanto mais livre quanto mais longa se tornar, mas é precisamente o excesso de alongamento que põe em risco essa liberdade, relativizando-a num movimento (do livre-arbítrio) que torna o Pilates mais custoso, doloroso, e requerente de mais alongamento “posterior”. Quanto maior for o desejo de liberdade mais difícil será alcançá-la. O desejo, bem como a reeducação postural, deverá ser espontâneo e “subconsciente”. O Pilates deve seguir a mesma lógica. O “crescimento” é do próprio ráquis, numa aproximação (in)determinada de Sujeito e Objeto, que é a própria “ciência” perfazendo-se num monismo corpo-mente “ético” que suspende a “moral de ressentimento” 3, “condenação à escolha” polarizadora.
Postura e movimento, eis os termos da relação entre o “insofrimento” e o princípio da Realidade. É o último que exige o mínimo de “pathos”, alguma defesa que permita compensar o Sistema. A relação é um “sofrer”, exige um mínimo de “dor”, sem a qual estacaríamos, morreríamos. Não que o Objeto não seja uma morte por “Amor”, mas a “vida” é o próprio paradoxo dualizando, parodiando, a Consciência, fazendo sofrer moralmente a “Ética”.
A tríade “Postura – movimento – força” 4 ousa harmonizar o conjunto terapêutico, incluindo o trajeto de um Placebo, o qual não pode arrogar-se de tomar a dianteira. Porque se é ele que protagoniza o processo, existe uma grande probabilidade de se trair a “Razão – Realidade” da “Physis”, que é, aqui, o “mal menor”, o “pathos” desejável, a melhor garantia de despolarização clínica.
Uma postura “racional”, portanto, mais tolerante à Realidade, é, assim, o garante de um movimento mais são, permitindo vivificar uma relação terapêutica em que o “realismo” científico compensa mais eficazmente a promessa de uma salvação plena. Trata-se, então, de promover a relação “fenomenal”, a liberdade “relativa”, protelando o Absoluto indolor em que o corpo terá sido transcendido, subtraído ao que tem de artifício.
Referências bibliográficas
- Coelho L. Pilates e Reeducação Postural: Fisioterapia e Epistemologia. Gazeta Médica. 2024;11(3):257-8. https://doi.org/10.29315/gm.v1i1.851
- Marcuse H. Eros and Civilization – A philosophical inquiry into Freud. Boston: Beacon Press; 1966.
- Nietzsche F. Humano, demasiado humano. Edição original de 1878.
- Coelho L. O anti-fitness ou o manifesto anti-desportivo. Introdução ao conceito de reeducação postural. Quinta do Conde: Contra-Margem, 2008.
Artigo relacionado