
Nos últimos anos, a política portuguesa tem sido palco de uma crescente dicotomia entre visões individualistas e comunitaristas, especialmente entre os mais jovens. O debate ideológico tornou-se, em muitos casos, um fenómeno quase tribal, onde a filiação política se assemelha ao apoio a um clube de futebol: mais emocional do que racional.
Que consequências tem esta forma de encarar a política? Os desafios do futuro exigem reflexão séria e soluções estruturais. A regulação da inteligência artificial, a transição ecológica e a precariedade do mercado de trabalho são questões que exigem mais do que uma adesão cega a ‘slogans’ ou promessas vazias. Contudo, uma nova cultura de individualismo exacerbado ameaça obscurecer a necessidade de ação coletiva.
Nos últimos anos, assistimos a uma ascensão meteórica da mentalidade do “self-made man” – a crença de que o sucesso financeiro é um percurso estritamente individual, independente de fatores estruturais. Cada vez mais jovens mergulham em investimentos digitais, criptomoedas e esquemas de enriquecimento rápido, convencidos de que o esforço pessoal é a única variável do sucesso.
Só em Portugal, entre 2019 e 2024, o número de proprietários de ativos digitais cresceu 122%. Em França, 57% dos investidores em criptomoedas têm entre 18 e 34 anos. Estes números refletem uma tendência alimentada por redes sociais e influencers financeiros que promovem a ideia de que qualquer um pode tornar-se milionário do dia para a noite.
Plataformas como YouTube, Instagram e X estão saturadas de conteúdos que reforçam esta mentalidade, favorecidos por algoritmos que privilegiam discursos de motivação financeira extrema e receitas milagrosas para o sucesso, criando uma ilusão perigosa de independência total. Influencers exibem rotinas de sucesso e prometem segredos para a liberdade financeira, omitindo as elevadas taxas de fracasso.
O impacto desta mentalidade não tarda a manifestar-se: uma geração que enfrenta um choque brutal entre as expectativas virtuais e a realidade económica. Quando percebem que o dinheiro fácil é, na maioria dos casos, uma miragem, muitos jovens sentem-se frustrados e desiludidos com o sistema. Essa frustração, combinada com a precariedade laboral e a crise habitacional, gera um sentimento de alienação e ceticismo em relação ao percurso tradicional de aposta no estudo e na formação, com consequentes frutos no mercado de trabalho.
Mas os dados são claros: em 2024, a taxa de desemprego entre licenciados em Portugal foi de 4,7%, enquanto para aqueles com apenas o ensino secundário foi de 7,3%. Além disso, um estudo do Banco de Portugal revelou que a remuneração média dos licenciados é cerca de 50% superior à dos trabalhadores com menor escolaridade. Estes números confirmam que, apesar dos desafios, a formação académica continua a ser um dos melhores caminhos para a estabilidade e mobilidade social.
Se há um debate fundamental para o futuro dos jovens portugueses, ele passa por temas como o Serviço Nacional de Saúde, a educação, a habitação, os salários e as condições de vida. A obsessão pela riqueza instantânea e o culto do individualismo são distrações perigosas que enfraquecem um modelo de sociedade solidária e equitativa.
O futuro não se constrói sozinho. A História ensina-nos que o verdadeiro progresso resulta do equilíbrio entre ambição pessoal e responsabilidade coletiva. Cabe à nova geração decidir de que lado quer estar: na ilusão da riqueza imediata ou na construção de um país mais justo e sustentável.