
A fórmula de meias-finais a duas mãos desvirtua, sem dúvida, o espírito de uma Taça de Portugal onde todos os outros jogos são de mata-mata. O chamado espírito da Taça desvanece-se quando a diferença de cilindrada entre os competidores é assinalável, como sucedeu no embate entre Rio Ave e Sporting. Pode dizer-se que a equipa de Vila do Conde chegou longe na prova, e dela saiu com dignidade. Daí a ter-se uma eliminatória feita de incerteza vai o mundo de que é feito, em boa parte, o futebol português.
Primeira nota: com o Sporting em plena luta pelo título nacional a quatro jornadas do fim do campeonato, Rui Borges foi a jogo com uma equipa muito forte, optando, por exemplo, por não dar descanso a Hjulmand (fez o jogo todo) e Gyokeres (em campo 67 minutos), o que revela não só que o técnico leonino não quis arriscar-se a qualquer surpresa, mas também que está muito confiante quanto ao atual estado de forma física dos nórdicos. Afinal, foi Quenda o mais poupado, numa partida que serviu para dar uma parte a Pedro Gonçalves, o trunfo que os leões sacaram da manga para o que falta da época.
ENTRADA DE LEÃO
Como tem sido hábito desde que Rui Borges chegou a Alvalade, o Sporting teve uma verdadeira entrada de leão, dominador, sufocante até na pressão que exercia nas saídas de bola do Rio Ave e ganhador da maior parte das segundas bolas, e começou por ameaçar por Matheus Reis (7 minutos), com Mizsta — atenção a este guarda-redes, que defende a baliza onde já estiveram Oblak e Ederson — a mostrar qualidade, e esteve perto de marcar dois minutos depois quando Gyokeres, perfeitamente isolado, não foi capaz de bater o guardião polaco. Dois avisos de bola corrida, e à terceira foi de vez, de bola parada, após um pontapé de canto marcado por Debast, que Gyokeres penteou ao primeiro poste, para Inácio marcar ao segundo, afinal a forma mais clássica de tirar proveito de um canto...
Este golo mudou o jogo, não pela parte do Rio Ave, que tinha sido subjugado, apesar das boas intenções de Petit, que defendia em 4x4x2 (Novais e Clayton na frente), mas porque o Sporting, como também tem sido hábito, decidiu baixar o ritmo e passar a controlar as operações. Baixar o ritmo foi uma boa ideia para Pedro Gonçalves, que nesta fase ainda delicia os adeptos com o seu futebol de fino recorte, mas a quem ainda falta ritmo e intensidade, algo que só se ganha com minutos jogados. Teve direito a 45, não esteve mal, mas acrescentou pouco.
Mas a forma mais soft com que o Sporting passou a encarar o jogo foi uma das faces da moeda que teve na outra face um Rio Ave finalmente com tempo e espaço para mostrar o seu futebol e deixou um sério aviso a Rui Silva (32), num lance em que haveria fora de jogo de Clayton. Foi o melhor período do Rio Ave, aqui e ali contraditado pelos passes longos para Gyokeres, que lembravam à turma de Vila do Conde que o leão, mesmo com pouca fome, continuava a ser temível.
MAIOR EQUILÍBRIO
A segunda parte trouxe maior agressividade, com as entradas de Bakoulas por Aguilera e Catamo por Pedro Gonçalves , e novamente foi o Sporting a pegar na partida, como se estivéssemos a assistir a um remake do início do jogo. E de tal forma foi que desta feita o Sporting não precisou de 11, mas apenas de cinco minutos para chegar ao 2-0, pelo inevitável Gyokeres, que estava no sítio certo para recargar um remate de Catamo.
Com os leões com uma vantagem de quatro golos na eliminatória, depois de Rui Borges não ter querido abusar de Pedro Gonçalves, foi a vez de mostrar preocupação em poupar Debast (sendo Hjulmand uma das traves-mestras da equipa), trocando-o por Esgaio, que tenta compensar em entrega o que lhe falta em técnica, especialmente para desempenhar aquelas funções.
Peti não ficou a olhar, e fez duas substituições (56') que deram mais qualidade à sua equipa, já que Olinho e Tiago Morais tiveram o condão de equilibrar, verdadeiramente, as operações. E de tal forma foi que o o alemão teve uma jogada fenomenal aos 64 minutos, culminada com um petardo que estalou na trave de Rui Silva e terá beijado a linha de golo sem entrar completamente (para quando a tecnologia da linha de golo?). Dois minutos depois, uma tremenda combinação entre Tiago Morais e Clayton colocou André Luís na cara de Rui Silva, para o 1-2.
Imediatamente, Rui Borges tirou Trincão e Gyokeres (segue-se o Bessa, num jogo de tudo ou nada para ambos) lançando Biel (excelentes pormenores) e Harder (haja quem lhe diga que só tem a perder em ser egoísta e querer sofregamente fazer tudo sozinho para mostrar serviço) e Petit decidiu dar descanso ao seu jogador mais consagrado, o turco Tiknaz. Sem dúvidas quanto ao finalista da Taça, ambas as equipas ainda ameaçaram antes do apito final, mas o destino da eliminatória há muito que estava traçado. Uma nota final para a colocação de Maxi Araujo à direita. Foi conjuntural, ou serviu de experiência?