A 21 de abril de 1985, o mundo do automobilismo assistiu ao nascimento de uma lenda. No Autódromo do Estoril, sob uma chuva torrencial, Ayrton Senna conquistava a sua primeira vitória na Fórmula 1, numa exibição memorável que permanece até hoje como uma das mais impressionantes da história da modalidade. Hoje, completam-se 40 anos desse momento icónico.

Na altura, Senna corria pela equipa Lotus-Renault, e havia dado sinais do seu talento desde os primeiros momentos da temporada. Mas no Grande Prémio de Portugal, na segunda prova do campeonato de 1985, o brasileiro de 25 anos assumiu por completo o controlo da corrida, desafiando as condições climatéricas extremas e mostrando ao mundo que não era apenas promissor, era verdadeiramente especial.

A pole position e um início dominador

Senna começou o fim de semana de forma dominante. Nos treinos, foi sempre o mais rápido e até bateu o recorde de treinos da pista, que pertencia a Nelson Piquet. Na qualificação, conquistou a pole - a primeira na carreira - de forma autoritária.

Chegada a grande corrida, o tempo decidiu entrar em prova. O circuito português ficou completamente encharcado, com visibilidade reduzida e aquaplanagem constante. Muitos pilotos consideraram a prova impraticável, mas para Senna, foi o cenário ideal para brilhar.

Logo no arranque, o brasileiro manteve a liderança e, volta após volta, começou a abrir vantagem sobre os restantes pilotos. Enquanto os mais experientes enfrentavam dificuldades e perdiam o controlo dos seus monolugares, Senna parecia deslizar com elegância sobre a água, dominando a pista com precisão milimétrica ao volante do seu Lotus 97T.

Exibição de mestre à chuva

Ao longo das 67 voltas, Senna foi absolutamente intocável. Controlou a corrida de princípio a fim, mostrando uma capacidade rara de leitura de pista, equilíbrio no controlo do carro e uma serenidade invulgar para alguém com tão pouca experiência na categoria máxima do automobilismo (tinha apenas 15 corridas na F1 antes desta).

Terminou a corrida com mais de um minuto de vantagem sobre o segundo classificado, Michele Alboreto, e uma volta de avanço a quase todo o restante pelotão. A sua performance foi tão avassaladora que muitos comentadores, na época, já apontavam Senna como futuro campeão do mundo — uma previsão que se confirmaria poucos anos depois.

«Ayrton Senna voltou a demonstrar que conduzir sob chuva é com ele! Há quanto tempo não se via uma corrida em que o segundo classificado fica a mais de um minuto (quase três quartos de volta!) o terceiro e o quarto levam mais de um a volta, e, a partir do quinto, a diferença atinge de duas voltas para cima?!... Toneladas de coragem e... classe!», escreveu A BOLA, sobre a prestação do brasileiro.

«Dedico esta vitória à minha equipa»

Após a corrida, foi um Senna que não conseguia esconder a satisfação que falou aos jornalistas: «É um dia muito feliz para mim e dedico esta vitória à minha equipa, que tudo fez para que eu a alcançasse.»

« [As condições] foram péssimas, muito perigosas por causa da chuva. Foi muito pior do que no Mónaco, no ano passado. O grande problema é que não se via nada. Por isso levei tanto tempo a dobrar o Mansell. Não o via, nem o que se passava atrás de mim. Passei por alguns momentos de muita aflição e, num deles, cheguei mesmo, sair da pista, mas tive sorte, não bati em nada e pude continuar», disse o brasileiro, após a vitória.

O nascimento de uma lenda

A vitória no Estoril foi mais do que um triunfo desportivo. Foi o início de uma carreira lendária, que incluiria 41 vitórias, três títulos mundiais e um estatuto eterno de ícone do desporto mundial.

Em Portugal, esse dia ficou gravado na memória dos fãs como o momento em que o país viu, em primeira mão, o surgimento de um génio das pistas. O próprio Senna, anos mais tarde, reconheceria a importância daquela tarde mágica. Rejeitando a crença generalizada de que a sua vitória em Donington, em 1993, foi a sua melhor corrida. Senna foi citado dizendo: «Nem pensar! Eu tinha controlo de tração lá. Foi uma boa vitória, mas comparada com o Estoril de 85 não foi nada.»

«Que teste para este menino — e que resposta ele deu! Sob chuva constante, numa pista alagada, ele pregou um valente banho a craques... humilhados» (A BOLA)

Quatro décadas depois

Quarenta anos volvidos, o triunfo de Ayrton Senna no Estoril continua a ser lembrado com admiração e saudade. Mais do que a sua primeira vitória, foi um testemunho de coragem, talento e determinação, num cenário que testou os limites de todos os pilotos — menos de um.

Senna partiu cedo demais, mas a sua lenda nasceu naquele dia chuvoso em solo português. E permanece viva, inspirando gerações de apaixonados pela Fórmula 1.