
Portugal enfrentou em 2024 um dos piores anos no combate ao cibercrime, revela o Relatório Anual de Segurança Interna (RASI). A proliferação de ataques digitais altamente sofisticados, recorrendo à inteligência artificial, redes internacionais e técnicas avançadas de intrusão e manipulação, colocou instituições públicas, empresas e cidadãos sob ameaça constante.
O CERT.PT validou 11.163 incidentes de cibersegurança, quase o triplo dos registados em 2023, sinalizando uma escalada sem precedentes nas ameaças digitais. O tipo de ataque mais comum foi “código malicioso”, com 8.428 ocorrências, seguido por fraudes ‘online’ e phishing — práticas visando, em especial, escolas, universidades, hospitais e serviços administrativos.
As autoridades destacam que o uso de ferramentas de inteligência artificial permite lançar ataques mais rápidos, automatizados e difíceis de detetar, nomeadamente ransomware altamente direcionado, campanhas de smishing via SMS e engenharia social sofisticada. O RASI alerta que Portugal tornou-se vulnerável a redes transnacionais de cibercrime, muitas vezes com base em países terceiros e articuladas com grupos de crime organizado.
Entre os objetivos mais atacados estiveram infraestruturas críticas nacionais, como sistemas informáticos de hospitais, redes municipais, plataformas de justiça e sistemas de cobrança fiscal. O relatório identifica tentativas de sabotagem, espionagem digital, roubo de dados pessoais e financeiros e extorsão de empresas com pedidos de resgate digital.
No plano criminal, o número de arguidos e detidos por crimes informáticos aumentou 50% em 2024. A maioria dos casos envolveu acessos ilegítimos, clonagem de cartões, esquemas de fraude com MBWay e burlas mediante redes sociais e sites falsos.
O relatório sublinha que, embora tenha havido uma ligeira descida nas participações formais de crimes informáticos (–0,8%), o impacto real do cibercrime é muito superior, já que muitos casos não são denunciados por desconhecimento, medo reputacional ou complexidade técnica.
As autoridades portuguesas intensificaram a cooperação com agências europeias e internacionais, nomeadamente a Europol, Interpol, ENISA e grupos especializados da UE, e participaram em ações conjuntas de combate a redes de cibercrime organizadas. Portugal integra redes como a Red CibEL@ e investe na formação de equipas técnicas especializadas, incluindo forças da PSP, GNR e PJ.
O RASI 2024 reforça a necessidade de uma resposta articulada e contínua ao cibercrime, incluindo revisão legislativa, reforço da segurança digital, sensibilização pública e apoio técnico a vítimas. Está previsto para 2025 o lançamento de uma nova estratégia nacional de cibersegurança, que deverá incluir campanhas educativas para escolas e pequenas empresas, sectores especialmente vulneráveis.
A proliferação de ameaças cibernéticas também tem alimentado preocupações em matéria de segurança nacional, já que muitos ataques estão associados a operações de desinformação, espionagem e tentativas de desestabilização política e institucional, em linha com tendências internacionais e contextos de guerra híbrida.