Asfixiadas por um modelo competitivo injusto, as equipas do interior continuam a ser empurradas para fora da linha de meta nos vário escalões em que participam. Está na hora de mudar as regras do jogo, a bem dos abnegados que começam a revelar cansaço e frustrações, que não mereciam, nem precisavam.

É inconcebível o que está a acontecer esta época e nem há como ficar calado. Os quadros competitivos de futsal têm de ser mudados e com urgência, a bem do próprio futuro da modalidade, pelo menos espalhada pelo território nacional, sem elitismos bacocos e gastos, com um desporto que se diz inclusivo e de proximidade. Será? E se sim, por quanto mais tempo?

É só olhar para a realidade de 2024/2025. A situação agudizou-se e por mérito próprio das equipas da Beira Interior, que se qualificam para Taças Nacionais em TODOS os escalões, defrontam olhos nos olhos adversários de suposta mais valia, e que perdem, algumas delas, um único jogo em mais de dez partidas realizadas contra adversários de outros voos e orçamentos, Equipas que, embora todo esse esforço e superação. por uma derrota, vêem a subida negada por termos quadros competitivos em que anualmente só sobem 2 a 4 equipas por ano num escalão inteiro? Duas a quatro equipas num universo de largas centenas de equipas por escalão a nível nacional? Quando perdeu a meritocracia um lugar à mesa nos quadros competitivos?

Bem sabemos que a coesão territorial é um barrete de todo o tamanho e que na verdade há claramente uma mão invisível que teima em empurrar o interior mais para dentro de si (um dia abraçamos Espanha) e que o desporto não é exceção neste discurso auto-exclusivo a que vamos assistindo. Mas isto é verdadeiramente inconcebível:

  • UD Pinhelenses feminino sénior – 9 jogos, 1 derrota – não sobe

  • UD Cariense masculino júnior – 10 jogos, 3 derrotas – não sobe

  • SLA Dominguiso masculino juvenil – 12 jogos, 3 derrotas – não sobe

  • SLA Dominguiso masculino iniciado – 12 jogos, 2 derrotas – não sobe

Aqui estão quatro equipas belíssimas, com plantéis extraordinários e treinadores altamente competentes e qualificados a fazerem do impossível algo possível, com uma evolução gigante num curto espaço de tempo, trazida pela competitividade que só estes contextos trazem, e mesmo assim a serem travados por um centralismo do mais provinciano que há.

Deixem-nos sonhar. Num escalão com centenas e centenas de clubes pelo país inteiro, nunca podem só subir e descer 2 a 4 por ano. Nunca. É aqui que o desporto, que devia ser espaço de superação, de inclusão e de justiça meritocrática, se torna espelho da desigualdade que separa o país em dois, uma linha vertical invisível e cheia de poder, entre os que têm peso político e associativo e os que, ano após ano, são remetidos ao papel de figurantes.

Não se trata de um acaso nem de um lapso de regulação. Trata-se de um sistema estruturado que dificulta de forma sistemática a progressão dos clubes do interior, assentes num gigante esforço comunitário, pela dedicação de treinadores voluntários e abnegados e pela paixão dos atletas que acreditam que no desporto reina uma igual oportunidades de sonhar e chegar longe se a qualidade e vontade existir. Vamos dizer-lhes que isso não chega e ser honestos? Estamos a dar um sinal a centenas de jovens e famílias que o esforço não compensa, que a realidade associativa está viciada, e que os sonhos são para outros.

E o papel das associações destas regiões? É galvanizarem-se. É insurgirem-se contra regulamentos bafientos e com intuitos claros. Vejam quem tem subido, ano após ano, via Taças Nacionais, em todos os escalões. Vejam de onde são. Vejam a que associações pertencem.

O tempo da palmada nas costas e de “parabéns, deram o vosso melhor” não chega mais. Está na hora de rever os regulamentos com base na realidade e não apenas nos interesses instalados. Está na hora de incluir a dimensão territorial no planeamento do desporto federado, a bem da sua continuidade e prática por todo o território. Não afunilem mais o que já é afunilado por si mesmo.

Pratiquem-se os conceitos que se apregoam nos discursos de tomada de posse: ética, justiça, equidade… Sejam o que prometem.

FERNANDO TEIXEIRA

EDITOR DE DESPORTO