![Dário Guerreiro: “O melhor que podia fazer pela minha carreira era vir viver para Lisboa, mas gostava de provar que não temos de abandonar as nossas terras”](https://homepagept.web.sapo.io/assets/img/blank.png)
No teu último espetáculo, "Vou Ficar", falavas de sair de casa dos pais. Não necessariamente de Portimão, mas ponderaste se devias ir para Lisboa?
Nunca coloquei isso. Faria sentido artisticamente. É capaz de ser a melhor coisa que faria para a minha carreira, porque, parecendo que não, se tu estás perto de Lisboa, do Porto, dos grandes centros urbanos onde as coisas acontecem tu passas a ser uma opção. Deixa-me tentar pôr isto de forma a que não seja minimamente mal interpretado ou cruel: precisas da participação de um comediante para ir à televisão fazer uma coisa qualquer, já nem estou a falar de experimentares material com mais frequência e teres aqui mais salas. Mas precisas de alguém, queres chamar alguém. A logística que implica terem que me chamar a mim é completamente diferente da logística que implica chamarem um gajo que vive aqui na periferia, aqui em Lisboa. Não têm que lhe pagar custos de transporte, o hotel, uma série de outras coisas. E lá está, depois é uma bola de neve, aparecendo menos vezes, lembram-se de ti menos vezes. E portanto é natural que a melhor coisa que eu poderia fazer à minha carreira provavelmente seria vir para cá. Só que eu também gostava de tentar provar a mim mesmo, e consequentemente às pessoas que não são nem de Lisboa nem do Porto, que é possível fazer uma carreira minimamente interessante sem termos que abandonar as nossas terras, as terras de que nós gostamos. Porque o nosso país é mais pequeno do que a Califórnia. É suposto dar. Tem que dar. É mais perto de Portimão até Lisboa, do que de São Francisco até Los Angeles. A escala do nosso país permite que não precisemos de sair da nossa terrinha no meio do Alentejo ou em Viseu para termos que ter uma carreira na cultura, ou outro tipo de carreira qualquer. Só que na prática ainda não está bem cimentado, ainda não deu para provar bem isso.
Acredito que seja difícil ter essa consciência de que 200 e tal quilómetros acima e pensavam mais em ti.
Sim, ou então sou eu que estou a ser cobarde e tento usar isso como desculpa para nunca ter vingado de alguma forma. “Em Lisboa também eu…” Posso usar este argumento para me acalmar, para me proteger e justificar porque ainda não atingi determinados objetivos.
Estava a ler sobre os “Cebola Mol”, projeto de comédia musical do Eduardo Madeira e do Filipe Homem Fonseca. Quando surgiram, com o sucesso que tiveram, a indústria musical ficou chateada, porque não consideravam aquilo música a sério. Também dentro do meio musical a comédia tem má reputação.
Claro, a comédia sempre foi o parente pobre [das artes]. Há certos programadores culturais que se recusam e preferem morrer do que ter comédia e “stand-up comedy” nos seus teatros. Já estamos habituados um bocadinho a esse preconceito que existe. E continua a ser super complicado reservar salas, sobretudo quando entramos no espetro autárquico.
Gustavo Carvalho entrevista pessoas para quem a comédia é paixão e profissão. Por vezes abre a porta a conversas sobre outros temas culturais que o entusiasmam, seja sobre teatro, música, digital, televisão ou cinema. A comédia, a arte e a cultura que estão para acontecer, todas as terças-feiras no Humor À Primeira Vista. Oiça aqui mais episódios: