Um general sérvio oriundo da Bósnia, que foi condenado em 2001 pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) pelo seu papel no massacre de Srebrenica de 1995, confessou ao tribunal de Haia que foi responsável por “ajudar e encorajar o genocídio” e por cometer “um crime inimaginável e imperdoável”.
Numa carta enviada ao presidente de um mecanismo residual do TPI, Radislav Krstić, o antigo general de 76 anos que liderou um ataque ao enclave muçulmano de Srebrenica, garantiu que não procura “perdão nem justificação”. Depois de 26 anos atrás de grades em várias prisões da Europa, o ex-militar defende agora as resoluções das Nações Unidas sobre o conflito nos Balcãs, bem como uma resolução de maio que faz do dia 11 de julho o dia oficial de homenagem às vítimas.
“Não procuro compreensão porque sei que não vou nem posso recebê-la”, escreveu.
Krstić foi a primeira pessoa a ser condenada por crimes de guerra e pelo crime de genocídio na antiga Jugoslávia, tendo sido condenado pelo TPI a 46 anos de prisão. A sua confissão é um destaque mediático por a Sérvia, e os líderes dos cidadãos de etnia sérvia a viver na Bósnia, nunca admitiram a existência de um genocídio em Srebrenica (Krstić é um dos primeiros oficiais militares a fazê-lo).
O massacre de Srebrenica, levado a cabo pelas forças sérvias e apoiado pelo exército jugoslavo, foi um dos momentos mais sangrentos de uma guerra combatida entre 1992 e 1995, marcada por combates de guerrilha, bombardeamentos indiscriminados de populações civis, limpeza étnica e violações em massa. Apesar das organizações de direitos humanos terem documentado a existência de crimes de guerra de todas as partes, a Organização das Nações Unidas e o TPI são claros em atribuir a maioria das responsabilidades aos sérvios.
Em Srebrenica, um enclave muçulmano na Bósnia, os soldados de etnia sérvia mataram cerca de 8.300 homens e rapazes capturados durante a guerra. Até hoje, massacre é considerado como o único genocídio a ocorrer na Europa desde o final da Segunda Guerra Mundial.
Contudo, a confissão de Krstić não convence toda a gente, muito menos os sobreviventes e familiares das 8.300 vítimas do massacre. Num comunicado conjunto, citado pelo “The Guardian”, os grupos Mães de Srebrenica e a Associação de Vítimas e Testemunhas do Genocídio sugeriram que a carta pode ser meramente uma estratégia de Krstić conseguir uma libertação antecipada, quando ainda faltam ser cumpridos mais de 20 anos da sua sentença.
“Este tipo de comportamento é uma continuação de uma prática já estabelecida por criminosos de guerra, que tentam ser libertados a qualquer custo”, apontaram as organizações. Recordamos que outras pessoas condenadas depois da Guerra da Bósnia, que confessaram os seus crimes e tiveram uma saída antecipada, acabaram por se retratar e por negar a existência de um genocídio depois de serem libertados.
As organizações exigiram que Krstić confessasse a localização de valas comuns, desviadas em 1998, para que as famílias possam encontrar e enterrar os desaparecidos da guerra. Afirmaram que, até lá, a carta não passa de uma “mentira”
“Em todos os momentos de todos os dias, penso nas vítimas do genocídio em Srebrenica, lamento-as e rezo pelas suas almas. Sei que a mãe e a irmã de uma vítima inocente não vão acreditar que as minhas palavras são verdadeiras, e também sei que as minhas palavras não vão reduzir a dor e sofrimento que nunca vão desaparecer”, vincou o general. E garantiu que, caso seja libertado antes de morrer, irá pedir permissão às autoridades locais em Potočari para visitar o memorial em homenagem às vítimas do genocídio, para “fazer uma vénia às vítimas e pedir desculpa”.