A União Europeia trocou as represálias por calma, bom senso e fazer contas. Três boas maneiras de reagir às taxas aduaneiras de Donald Trump. Se os europeus acham que as “tarifas” são más para os americanos e para a economia, não devem impô-las a si mesmos. Menos ainda à pressa.

É impossível saber o que verdadeiramente quer o presidente dos Estados Unidos da América com a maior e mais súbita imposição de direitos aduaneiros (as impropriamente chamadas tarifas) aos seus parceiros comerciais, amigos, inimigos e ilhas habitadas apenas por pinguins. Mas é possível saber o que nos interessa: um mundo onde a Europa tenha valor e onde os valores da Europa, os valores ocidentais de Liberdade, Democracia e Estado de Direito tenham aliados. E isso pede mais do que respostas excitadas ou aguerridas.

Se Trump quer forçar a Europa a alinhar com os Estados Unidos numa guerra comercial contra a China, a troco, então sim, de não haver taxas aduaneiras entre os dois lados do Atlântico Norte, como acreditam alguns, então não quer estes impostos sobre os consumidores americanos (que é o que as taxas aduaneiras de facto são) para financiar o déficit do governo dos Estados Unidos. Se quer os impostos, as “tarifas” são para manter e não há muito por onde negociar. Uma e outra teoria são incompatíveis. Mas ambas convergem num ponto: Trump e a sua América querem desfazer a ordem internacional, a ordem demo-liberal e globalista das últimas décadas e impor outra a aliados e adversários. E a Europa, o que deve querer?

A resposta impulsiva e retaliatória tem o enorme defeito de castigar tanto os americanos que exportam para a Europa como sobretudo os consumidores europeus que acabariam a pagar as taxas aduaneiras. Se as “tarifas” são más para os americanos, não é por serem uma retaliação que passam a ser boas para a Europa e os europeus.

A outra opção, a resposta radical de cortar com a América e procurar um aliado na China tem o evidente defeito de ignorar que a China só defende a ordem internacional e a globalização na medida em que dela beneficia. Não há um pingo de convicção em Pequim nas virtudes das economias abertas e liberais. Como as nossas.

A opção de alinhar com os Estados Unidos com absoluta fé é impossível depois de tudo o que Trump e Vance fizeram. Estes não são os Estados Unidos do pós Segunda Guerra que tinham interesse em manter a Europa próxima, tratá-la como aliada e em garantir a sua segurança. Estes são imprevisíveis, hostis aos aliados e amigos dos extremistas iliberais. Não são de confiança.

A resposta consistente com o que a Europa tem sido é a que pede que a União Europeia mantenha a convicção na globalização e nas virtudes dos mercados abertos. A prova de que a interdependência limita os conflitos é o que está a passar-se. As consequências da guerra estão a cair, em primeiro lugar, em cima de quem a iniciou. Além disso, a Europa precisa de aliados e de fornecedores de matérias primas críticas. Negociar com esses países, do Brasil à China, da Índia ao Canadá é uma maneira de ser diferente da América e de ser mais interessante para esses parceiros.

A Europa não precisa de proteccionismo e dirigismo para se reindustrializar. Precisa de ambiente regulatório, de capital e investimento e de competitividade. E isso é compatível com mercados razoavelmente abertos.

A resposta consequente também exige algum castigo aos Estados Unidos. Não por vingança, mas para reduzir o apetite agressivo da América. É aí que entram as grandes tecnológicas americanas. Somos profunda e utilmente dependentes delas. Mas elas contribuíram para a vitória de Trump, promovem a agenda de Vance e exigem que Washington as defenda contra as regras da União Europeia. Alguma pressão far-lhes-á bem para se moderarem no apoio ao governo americano e no ataque às regras europeias. Mas sem excessos. À data de hoje não temos alternativas europeias. E não as queremos feitas nos governos.

Os italianos, os alemães, os franceses, os irlandeses ou os portugueses têm interesses e prioridades diferentes na sua relação comercial com a América. Para as defenderem não precisam, nem podem, de estratégias nacionais que traiam o poder europeu. Mas precisam de uma estratégia que reforce o poder europeu sem que a Europa deixe de ser o que é: liberal, democrática, tendencialmente aberta ao comércio. E, por esta altura, a líder do mundo Livre.