A Comissão Nacional do PS reúne-se este sábado, para discutir os resultados das eleições legislativas e definir o calendário interno para a eleição do novo secretário-geral do partido. Eis um guia para navegar a atualidade socialista.

O que é a Comissão Nacional?

A Comissão Nacional é o órgão deliberativo máximo do PS entre os congressos do partido. Tem como função determinar a linha de atuação do partido, estabelecendo a ação política que deve ter. Cabe-lhe também depois velar pela aplicação dessa linha política que foi definida.

É a ela que compete eleger o secretário-geral do partido (e censurar o desempenho deste, se achar que deve fazê-lo, para convocar novas eleições).

É também à Comissão Nacional que cabe marcar os congressos nacionais, aprovar as contas e os regulamentos do partido. E é ela que decide se algum militante deve ser suspenso por prejudicar o bom nome do PS.

Quem compõe a Comissão Nacional?

A atual Comissão Nacional do PS foi escolhida no 24.º Congresso Nacional do partido, que aconteceu em janeiro de 2024, após a eleição de Pedro Nuno Santos como secretário-geral. Foi vencedora a lista para a Comissão Nacional encabeçada pelo atual eurodeputado Francisco Assis, que incluía nomes tidos como pesos pesados do partido, como Marta Temido e Alexandra Leitão.

A lista liderada por Francisco Assis ganhou a Comissão Nacional
A lista liderada por Francisco Assis ganhou a Comissão Nacional MIGUEL A. LOPES/Lusa

Segundo os estatutos do PS, a Comissão Nacional é composta pelo secretário-geral (nesta altura, ainda Pedro Nuno Santos) e pelo presidente do partido (Carlos César), assim como o presidente honorário (Manuel Alegre) e o secretário-geral adjunto (João Torres). A eles, juntam-se os presidentes da Associação Nacional de Municípios e da Associação Nacional de Freguesias, se forem militantes do PS (atualmente, Luísa Salgueiro e Jorge Veloso).

Integram-na, ainda, mais de duas centenas de membros eleitos diretamente no Congresso, incluindo 10% de membros pertencentes à Juventude Socialista, e o secretário-geral da mesma, os presidentes das Federações, do PS/Açores e do PS/Madeira e os líderes da Tendência Sindical Socialista, da Associação Nacional de Autarcas Socialistas e das Mulheres Socialistas – Igualdade e Direitos.

Integram ainda a Comissão Nacional, de acordo com os estatutos do partido, os membros do Secretariado Nacional e da Comissão Permanente, além dos diretores dos órgãos de imprensa oficial do PS – mas sem terem direito a voto.

O que vai acontecer este sábado?

Normalmente, a Comissão Nacional reúne-se pelo menos de três em três meses. Mas, desta vez, o presidente do PS convocou, para este sábado, uma reunião extraordinária. Isto porque o secretário-geral, Pedro Nuno Santos, apresentou a demissão do cargo, após o duro resultado sofrido nas eleições legislativas pelo partido que, pela primeira vez na História, estará prestes a deixar de ser uma das duas maiores forças políticas no Parlamento, ficando atrás do Chega. Na altura, Pedro Nuno Santos disse que pretendia deixar “já” o cargo, por não querer ser um estorvo nas decisões" que o PS tem de tomar.

Pedro Nuno Santos apresentou a demissão do cargo de secretário-geral
Pedro Nuno Santos apresentou a demissão do cargo de secretário-geral JOSE SENA GOULAO | Lusa

Assim, a reunião extraordinária convocada por Carlos César acontece este sábado, dia 24 de maio, a partir das 11 horas, no Hotel Altis, em Lisboa.

Na ordem de trabalhos da reunião estão dois pontos: primeiro, a análise da situação política, face aos resultados das legislativas; e, em segundo lugar, a aprovação de calendários e regulamentos eleitorais internos. Quer dizer que será nesta reunião que deverá ficar definido quando serão as eleições para o próximo secretário-geral do PS.

Carlos César deverá propor à Comissão Nacional a realização de eleições internas no final de junho ou no início de julho. O congresso do partido poderá, contudo, ficar adiado para depois das eleições autárquicas (que acontecerão em setembro ou em outubro).

Esta é a hipótese mais forte e que deverá cumprir-se se não aparecerem mais candidaturas à liderança. Só se surgissem mais socialistas a querer disputar o lugar de secretário-geral, Carlos César poderia optar por também adiar as eleições internas até depois das autárquicas.

Quem será candidato à nova liderança?

Até ao momento, José Luís Carneiro foi o único a confirmar oficialmente a intenção de entrar na corrida à liderança. O antigo ministro já tinha sido candidato a secretário-geral do partido em 2023, quando perdeu as eleições internas para Pedro Nuno Santos.

Sendo que mais ninguém avançou, a confirmar-se como candidato único - sem qualquer competição - José Luís Carneiro deverá mesmo ser o próximo secretário-geral do PS. Ele que tem defendido que o partido deve viabilizar o Governo que vai entrar em funções e estabelecer compromissos de forma a "contribuir para a estabilidade política".

José Luís Carneiro foi o único a chegar-se à frente na corrida à liderança
José Luís Carneiro foi o único a chegar-se à frente na corrida à liderança MIGUEL A. LOPES/Lusa

Os três outros nomes mais apontados internamente como possíveis candidatos acabaram por afastar essa hipótese. São eles os antigos ministros Mariana Vieira da Silva, Fernando Medina e Alexandra Leitão.

Mariana Vieira da Silva defendeu a necessidade de reflexão dentro do partido e declarou mesmo que José Luís Carneiro não tinha "prioridade" só porque já pensava candidatar-se no próximo congresso. À última hora, decidiu não apresentar uma candidatura, em favor da "unidade do partido", num momento de eleições autárquicas. O mesmo alegou Fernando Medina - que tem defendido publicamente o “espírito de diálogo entre PS e AD.

A líder parlamentar – e agora candidata à Câmara de Lisboa – Alexandra Leitão (ainda muito conotada com a liderança de Pedro Nuno Santos) fora já mais rápida e a primeira dos três a colocar-se fora da corrida.

Indisponíveis declararam-se também nomes como Marta Temido, Duarte Cordeiro, Ana Catarina Mendes e Álvaro Beleza. Quanto ao popular governador do Banco de Portugal, Mário Centeno – que chegou a ser apontado como sucessor para primeiro-ministro, após a demissão de António Costa – nem sequer quis falar sobre o assunto, quando questionado.

Quem não ficou satisfeito com esta solução de candidatura única foi Miguel Prata Roque. O socialista já tinha lançado uma extensa declaração, ⁠sugerindo que houvesse diretas só “no final de outubro”, de modo a existir tempo para discussão e surgimento de novas candidaturas.

Candidaturas como, por ventura, a do próprio. O comentador da SIC Notícias pondera avançar como adversário de José Luís Carneiro. Prata Roque diz que quer combater os "consensos balofos", considerando que a“falsa unidade não reconcilia o PS com os eleitores.

Carlos César assume a liderança interina até à eleição do novo secretário-geral
Carlos César assume a liderança interina até à eleição do novo secretário-geral MIGUEL A. LOPES/Lusa

Enquanto não há eleição do novo secretário-geral, é o presidente do partido, Carlos César, quem vai ocupar interinamente o lugar. Isso mesmo está estabelecido nos estatutos do partido.

O que têm dito os socialistas?

Uma grande parte do PS tem sido vocal a defender que a escolha do novo líder só deveria acontecer após as autárquicas do outono.As datas de junho ou julho são precipitadas, na opinião de muitos.

Seis membros da Comissão Nacional – incluindo Daniel Adrião, ex-candidato à liderança do PS -vão apresentar, este sábado, uma proposta de deliberação com um calendário alternativo ao pensado por Carlos César. E também uma forma de eleição diferente. Querem que as eleições aconteçam só em outubro ou novembro e no formato de primárias abertas (isto é, às quais poderão concorrer não só militantes, mas também simpatizantes do partido).

Daniel Adrião está entre os socialista que apresentam uma proposta para adiar as eleições
Daniel Adrião está entre os socialista que apresentam uma proposta para adiar as eleições MANUEL DE ALMEIDA

À margem desta tomada de posição formal, tem sido grande o bate-boca. Francisco Assis, por exemplo, disse não fazer sentido uma disputa interna no partido numa altura em que devia estar a concentrar esforços no processo autárquico.

Ex-membros do governo de António Costa são da mesma opinião. António Mendonça Mendes, por exemplo, considera que o partido deve estar concentrado nas autárquicas e a fazer uma reflexão conjunta, rejeitando “precipitação em relação a decisões para o futuro”. Duarte Cordeiro defendeu que o partido deve escolher entre os melhores e não “eleger os mais rápidos". E João Costa pediu uma solução interna de gestão até depois das eleições autárquicas para concentrar o debate na campanha. Também nomes como Álvaro Beleza e Porfírio Silva assinalaram a necessidade de se esperar pelas eleições locais.

Só que é em sentido contrário que se têm manifestado os atuais autarcas do PS. Defendem uma solução rápida e de unidade, com eleições diretas até ao verão, para que a campanha eleitoral das autárquicas não seja afetada por uma disputa interna de liderança.

Luísa Salgueiro, a presidente da Associação Nacional de Municípios considera que o cenário de haver “um único candidato” é "o mais adequado" e diz que este terá “o apoio de todos os militantes socialistas". E Pedro Ribeiro, o líder da Associação Nacional dos Autarcas Socialistas, afirmou que o PS tem de "rapidamente criar as condições para eleger um secretário-geral o mais depressa possível".

Posição que vai ao encontro, por exemplo, das tomadas pelo ex-secretário-geral do PS Eduardo Ferro Rodrigues e dos antigos ministros José António Vieira da Silva e Pedro Silva Pereira, que consideram que uma mudança de líder rápida pode ajudar os socialistas no desafio das autárquicas.

Manuel Alegre avisa que será preciso o PS mudar mais do que o líder
Manuel Alegre avisa que será preciso o PS mudar mais do que o líder JOSE SENA GOULAO/LUSA

Seja como for, será necessário mudar no PS mais coisas do que o líder. Quem avisa é o presidente honorário do partido. Manuel Alegre considera que o partido está fechado sobre si mesmo e defende que é preciso corrigir problemas estruturais, para evitar a decadência do PS.