Durante a missa solene que celebrou este domingo no estádio Rei Balduíno, em Bruxelas, na presença de mais de 30 mil pessoas, o Papa Francisco exigiu que os bispos "não encubram os abusos" e "que os abusadores sejam levados à justiça". "Peço-vos a todos: não encubram os abusos! Peço aos bispos: não encubram os abusos! Condenem os abusadores e ajudem-nos a curar-se desta doença do abuso", afirmou, numa cerimónia que marcou o final de uma visita à Bélgica.
Afirmando que, no encontro que teve com pessoas abusadas em Bruxelas, sentiu "o sofrimento", Francisco sublinhou que na Igreja "não há lugar para abusos, nem para encobrir abusos", recebendo aplausos dos fiéis. "Pensamos no que acontece quando os mais pequenos são feridos, maltratados por aqueles que deveriam cuidar deles, nas feridas da dor e da impotência, em primeiro lugar das vítimas, mas também das suas famílias e da comunidade", acrescentou o Papa.
E prosseguiu: "Com a minha mente e o meu coração, volto às histórias de alguns destes pequeninos que encontrei anteontem [sexta-feira]. Escutei-os, senti o seu sofrimento de abusados e repito-o aqui: na Igreja há lugar para todos, para todos, mas todos serão julgados e não há lugar para abusos, não há lugar para encobrir o abuso".
Neste duro discurso na Bélgica, país que está ainda a ressentir-se das centenas de casos de menores abusados por membros da Igreja, Francisco afirmou que "o mal não pode ser escondido", mas deve antes "ser trazido à luz, deve ser conhecido, como alguns abusadores fizeram, e com coragem". "E que o abusador seja julgado, quer seja um leigo, uma leiga, um padre ou um bispo: que seja julgado", acrescentou o Papa, que recebeu 17 vítimas belgas na nunciatura.
Ao amanhecer, com bandeiras belgas e do Vaticano, cerca de 35 mil fiéis ocuparam os seus lugares no estádio Rei Balduíno, onde o Papa argentino chegou pouco antes das 9h45 (8h45 em Portugal). O pontífice de 87 anos deu uma volta pelo estádio no seu "Papamóvel", aplaudido pelos fiéis que se juntaram aos gritos ao som da música retumbante dos órgãos.
Durante a sua visita de três dias, a primeira de um Papa à Bélgica desde João Paulo II em 1995, Francisco foi questionado sobre a crise de violência sexual contra menores, o acolhimento dado às pessoas LGBT+ e o lugar das mulheres na Igreja, temas que evidenciaram as elevadas expectativas dos católicos belgas em relação a uma doutrina que alguns consideram demasiado antiquada.
No sábado, a sua resposta sobre o lugar das mulheres provocou alguma deceção e incompreensão no seio da Universidade Católica francófona de Louvain-la-Neuve (UCL), uma das universidades católicas mais famosas da Europa, que, num comunicado de imprensa, criticou a "posição redutora" das opiniões que o Papa reiterou sobre as mulheres e o aborto.
A homilia de hoje foi celebrada no estádio que tem o nome do Rei Balduíno, que Francisco elogiou por ter abdicado por um dia, em 1990, em vez de dar o seu aval a um projeto de lei aprovado pelo parlamento que legalizava o aborto. A visita não programada de Francisco para rezar no túmulo do rei e a declaração de que a legislação era "homicida" foram alguns dos vários gestos que, num país outrora fortemente católico, enervaram os seus jovens secularizados, muitos dos quais se afastaram da fé.
Ainda assim, o estádio - que tinha uma capacidade de 37 mil pessoas para a missa - estava quase cheio para a homilia e a multidão vibrou quando Francisco chegou no seu "Papamóvel" e parou para beijar os bebés que lhe foram entregues.
Apelo ao cessar-fogo no Líbano
Na mensagem do Angelus, após a missa que celebrou em Bruxelas, o Papa Francisco apelou a um cessar-fogo imediato no Líbano e condenou a guerra no Médio Oriente, com "efeitos devastadores" para a população. "Acompanho com dor e preocupação o prolongamento e a intensificação do conflito no Líbano. Demasiadas pessoas continuam a morrer todos os dias no Médio Oriente", condenou o Papa.
Francisco apelou "a todas as partes para um cessar-fogo imediato no Líbano, em Gaza, no resto da Palestina, em Israel, para que os reféns sejam libertados e para que a ajuda humanitária seja autorizada".
O exército israelita continua a bombardear intensamente várias zonas do Líbano, depois de no sábado ter sido confirmada a morte do líder do grupo xiita Hezbollah, Hassan Nasrallah.