O Benfica está a transformar-se num caso de estudo, ao adotar o lema «É fácil? Então não é para nós.» Vinda de uma exibição convincente e de um triunfo prestigiante por 0-2 em Turim, frente à Vecchia Signora, a equipa de Bruno Lage começou por apresentar-se bem na Reboleira (como tinha feito nos primeiros 25 minutos contra o Casa Pia) e aos 10 minutos não só ganhava por 0-2 como também mandava no jogo, perante a desorientação dos anfitriões.

Com Di María (que sairia com uma lesão muscular aos 68 minutos) a jogar taticamente como o Messi dos dias de hoje, ou seja, com liberdade para andar por onde muito bem lhe apetecesse, tentando criar superioridade numérica no último terço do campo, e livremente espalhar a magia que tem no pé esquerdo, o que obrigava Aursnes a uma atenção redobrada à missão defensiva no lado direito, onde,  diga-se Tomás Araújo não justificou que Bah ficasse no banco, valeu Manu Silva – um equilibrador de setores com excelente estreia a titular – a combinar com um Kokçu, que jogou de mais a menos.

O Benfica rapidamente chegou ao 0-2 e em vez de ir à procura de fazer ‘mais sangue’ no adversário, acomodou-se, deixou de ser intenso, mostrou-se relapso em muitas saídas de bola (já iremos a esse departamento), e permitiu à equipa da Reboleira não só que evitasse o KO iminente, como ainda se reorganizasse tática e mentalmente.

O Estrela, que se apresentou em 3x4x3 e assim se manteve durante quase toda a partida (apenas nos minutos finais o gigante Dramé foi para ponta-de-lança à procura do jogo aéreo), começou a sentir-se menos desconfortável, Amin e Keliano passaram a ter mais bola, enquanto que Bucca os ajudava em zonas interiores e Rodrigo Pinho mostrava que mantém atributos técnicos diferenciados no pé esquerdo.

Pensava o Benfica que tinha o jogo controlado quando Travassos, produto de raiz de Alcochete, emprestado pelo Sporting, aos 28 minutos, aproveitou um deficiente trabalho de marcação de Akturkoglou e aplicou uma meia-distância que, depois de a bola desviar em Otamendi, bateu Trubin.

O Benfica decidiu então regressar ao jogo e seis minutos depois Pavlidis, com um remate indefensável à entrada da área (depois de trabalho inteligente de Otamendi que, deslocado, se alheou ostensivamente da jogada), fez o 1-3 e só não foi para intervalo com 1-4 porque Akturkoglou falhou um ‘chapéu’ fácil, após oferta de Ferro.  

MÁ SEGUNDA PARTE

Dificilmente a metade complementar podia ter começado pior para o Benfica, que pagou com língua de palmo um dos maiores defeitos do seu futebol: a equipa é francamente medíocre nas saídas de bola a partir do guarda-redes, que demasiadas vezes redundam em lances de perigo do adversário.

Desta vez, um passe frontal de Trubin apanhou Dramé a ganhar o lance a Pavlidis, e Banza a aproveitar para reduzir para 2-3. O nervoso miudinho regressou às hostes da Luz, os fantasmas do passado recente acordaram, e enquanto Kokçu e Akturkoglou se iam apagando, Di María dava sinais de pouca frescura e até Aursnes acertava pelo diapasão de Tomás Araújo e António Silva nos passes falhados, Bruno Lage demorou uma eternidade a mexer na equipa, ao contrário de José Faria que, com menos munição no banco, foi refrescando o onze à procura de fazer história.

Ia valendo ao Benfica o acerto de Manu e a fiabilidade de Otamendi, o que não era garantia suficiente para quem queria sair da Reboleira com os três pontos. Só aos 68 minutos, quando entraram Schjelderup e sobretudo Leandro Barreiro (intenso, afoito e atrevido, a apontar o caminho aos companheiros), o Benfica recuperou o controlo das operações. Onze minutos depois, foi a vez de Amdouni e Arthur Cabral entrarem em campo, numa altura em que o jogo já se estava a partir.

E foi Arthur Cabral, que inventou o lance que Dramé cortou com a mão, aos 85 minutos, que valeu castigo máximo para os encarnados, que o próprio avançado brasileiro se encarregou de falhar, rematando denunciado para defesa de Gudzulic.

O Benfica, que pensou que ia finalmente sossegar, continuou de coração nas mãos, sujeito aos ditames da sorte, no futebol direto escolhido pelo Estrela para tentar chegar ao empate. E aquilo que tinha condições para ser um jogo fácil, acabou como uma dor de cabeça, e um suspiro de alívio final, para os adeptos encarnados. Eriksson dizia muitas vezes aos seus jogadores que não havia jogos fáceis, havia, isso sim, jogos que se tornavam fáceis.

Mas tornar jogos fáceis não consta, pelos vistos do ADN desta equipa do Benfica.