
Enquanto defesa, marcar é algo que não acontece com extraordinária frequência a Kerstin Casparij. Por obra do acaso, conseguiu fazê-lo no dia em que trazia o pulso ligado com uma fita de três cores: rosa, branco e azul, a condizer com o equipamento principal do Manchester City.
Numa rara oportunidade para rematar, contra o Everton, a neerlandesa concretizou apenas o terceiro golo em três épocas em Inglaterra. O momento de celebração veio mesmo a calhar. Aproveitando a atenção dos fotógrafos, beijou a bandeira, astuciosamente atada ao pulso, que simboliza a comunidade transgénero.
Foi dessa forma que Casparij decidiu contestar a proibição de que futebolistas transgénero possam participar em competições femininas, uma decisão tomada pela FA, a federação inglesa. Até aqui, o organismo permitia a inscrição de pessoas transgénero desde que mantivessem os níveis de testosterona abaixo dos cinco nanomoles por litro durante 12 meses, mas a situação mudou.
“Entendemos que isto vai ser difícil para quem simplesmente quer praticar a modalidade que ama no género com que se identifica”, explicou a FA. No mesmo comunicado, o organismo confessou estar “a contactar” as 20 pessoas transgénero inscritas nas suas competições de modo a que o seu envolvimento no jogo “possa continuar”. Segundo divulgou o “The i Paper”, a FA enviou-lhes um e-mail a sugerir “terapia online” e que “transferissem o entusiasmo” para uma carreira na arbitragem ou ligada ao treino.
A decisão da FA surge depois do Tribunal Supremo do Reino Unido ter definido mulher para efeitos de tratamento de casos onde se debatam questões de género. “As disposições relativas à discriminação sexual só podem ser interpretadas tendo em conta o sexo biológico”, explicou o vice-presidente do Tribunal Supremo, Patrick Hodge. Nada foi dito sobre o impacto no desporto, mas, guiando-se pelo conceito estabelecido pela instância judicial, a FA tomou a iniciativa de excluir pessoas transgénero a partir de 1 de junho, seguindo o mesmo caminho de outras modalidades.
“Por vezes, há coisas maiores e mais importantes do que o futebol”, pronunciou-se Kerstin Casparij nas redes sociais. “As minhas irmãs trans merecem muito mais do que aquilo que este governo e a sociedade vos estão a dar.” E termina: “Vocês são mulheres, não importa o que se diga.”