
O debate é para as eleições legislativas em Portugal, mas, na troca de argumentos entre Paulo Raimundo e Rui Rocha, falou-se da Ucrânia, da Venezuela, de Cuba e até da Nicarágua. Tudo para provar como o modelo político-ideológico de cada adversário já deu mais do que provas de falência noutros pontos do globo.
Em debate, na SIC Notícias, o presidente da Iniciativa Liberal e o líder da CDU mostraram visões opostas quanto a, basicamente, tudo.
As comparações internacionais
Não foi preciso esperar mais do que alguns segundos para que os oponentes começassem a atirar com a falência dos modelos ideais de cada um. Paulo Raimundo foi o primeiro, a abrir o debate dizendo que a prova de que o modelo liberal falha é o setor da Habitação, onde o mercado não é regulado pelo Estado.
Rui Rocha não esperou mais e respondeu logo com o argumento de que a prova de uma ideologia falhada – a que está na base do PCP – encontrava-se nos exemplos de países como a "Venezuela, Cuba, Nicarágua". Países exemplo, prosseguiu, "de falhanço de programas económicos".
O líder liberal aproveita para fazer a ponte com o programa da CDU, que, afirma, “se fosse aplicado traria como consequência bancarrota", com um "aumento da despesa 40 mil milhões” de euros. Euro que, nota também, o PCP não se importaria de abandonar – o que seria "uma catástrofe para o país".
Paulo Raimundo tem uma tirada com um humor, na resposta a Rui Rocha, ironizando que acaba de perder uma aposta. “Apostei que Rui Rocha ia falar na Venezuela depois dos 15 minutos de debate, mas perdi, foi logo à entrada".
Mas era só esperar mais um pouco porque, depois dos 15 minutos, como previra o líder comunista, haveria lugar a mais um argumento de índole internacional – mesmo a fechar o debate.
Rui Rocha trouxe a questão da Ucrânia para cima da mesa, dizendo "que a posição do PCP é a oposta da IL. “O PCP entende que Putin fez bem em atacar a Ucrânia”, atirou o líder liberal. Perante a contestação do adversário - que disse por várias vezes que "ficava mal” a Rui Rocha acabar o debate nesses termos, o líder da IL elencou vários projetos de resolução relativos ao apoio à Ucrânia em que os comunistas votaram contra.
Tarifas Trump
Houve também terreno para discutir a resposta que o país deve assumir perante as tarifas sobre as exportações que os Estados Unidos da América querem aplicar.
Paulo Raimundo diz que a solução passa por garantir o aumento da produção nacional e diversificar os mercados, além de fomentar o mercado interno.
"Temos de aproveitar este momento para nos tornarmos o menos dependentes possível", sublinhou.
Isso faz-se, sustentou, com Portugal a ter uma voz na UE, e não a "beijar a mão" de Trump.
E só na censura a Trump, durante todo o debate, pudemos ouvir os líderes comunista e liberal convergirem. Porque também Rui Rocha admitiu que "as tarifas são prejudiciais” e que Trump tem “uma influência nefasta”.
"O caminho devia ser o contrário", defendeu.
Aumentar salários vs. reduzir impostos
Deixando de lado os temas internacionais, as visões da CDU e da IL voltaram a chocar quando se falou de riqueza. Porque, para Paulo Raimundo, ela deve aumentar através da subida dos salários. E, para Rui Rocha, é através da descida dos impostos.
Paulo Raimundo defende que "tem de ser possível" aumentar já o salário mínimo para mil euros (e não no final da legislatura, como propõe a AD, por exemplo).
"É alguma extravagância?", questiona. "Querem chegar a 2029 com um salário inferior ao que se paga hoje em Espanha, aqui ao lado?"
Já Rui Rocha quer que o país “baixe impostos para atrair investimento estrangeiro, para que as pequenas e médias cresçam e para os portugueses, sobretudo os jovens, terem melhores salários”. Isto porque, sustenta, “os salários não sobem por decreto, mas com produtividade e crescimento económico”.
A proposta da IL visa baixar impostos tanto às famílias como às empresas, numa redução “de 6.350 milhões”, que, afirma, é compensada por via do acréscimo de atividade.
Saúde
Na Saúde, Rui Rocha falou daquele que diz ser “o cadastro” do PCP, vindo dos tempos da “geringonça”, com o fim de parcerias público-privadas (PPPs).
“Havia PPP's em Portugal que serviam os utentes", mas o "PCP não descansou enquanto não convenceu o parceiro [PS] a extingui-las", afirmou o líder liberal.
Paulo Raimundo voltou a recorrer à ironia para contrapor a Rui Rocha, afirmando que, com as PPPs “é mais uma volta, mais uma voltinha: as crianças não pagam, mas também não andam".
O secretário-geral comunista alega que, nesse regime, “o Estado paga aos privados para cuidarem”, mas estes, depois, empurram para o SNS “os casos mais complexos, mais difíceis e que custam mais dinheiro”. “E o Estado paga duas vezes", frisou.
Rui Rocha expôs o modelo que os liberais defendem para a Saúde: “O utente escolhe se quer privado, público ou social”. “É semelhante", explicou, "ao que os funcionários públicos têm com a ADSE. Com uma garantia: não pagam mais por isso. Haverá susbsistemas - que serão criados - que os utentes escolhem."
Uma ideia que, aos olhos de Paulo Raimundo, é “a lei da selva". O secretário-geral do PCP surpreende ao admitir que não é contra a iniciativa privada na Saúde. Admite que "pode haver hospitais e clínicas privados". Mas, ressalva, não à custa do Estado.
"Quem quiser ter um negócio privado da Saúde, que tenha. Agora, não pode ser o Estado a sustentar isso", defende.
Habitação
E mais um tema fraturante em cima da mesa: a Habitação. A IL diz que quer pôr o "mercado a funcionar". Como pretende fazê-lo? Com "incentivo a mais construção”, para criar “dinâmica de mercado”, e com mais “celeridade nos processos de licenciamento”.
Um modelo que é rejeitado pelo líder da CDU. Porque, sublinha, neste setor, “não houve mãozinha do Estado" e os resultados (nefastos) estão “à vista”.
Aí, Rui Rocha responde que, na habitação em Portugal, 30 a 40% dos custos são impostos. "Veja lá se não está aqui a mão do Estado a funcionar", atirou ao adversário.
Mas, para a CDU, a resposta para a Habitação deve passar por aplicar 1% do PIB na reconversão dos edifícios do Estado em parque habitacional.
"Porque se ficar nas mãos do mercado do Rui Rocha, isto só vai piorar", alerta. "E não há medidas fiscais que resolvam isso."