"Está-se a iniciar a catástrofe que já tínhamos previsto na última campanha, que no ano passado foi próximo da vindima, em que as casas compradoras de uvas disseram que não queriam comprar uvas. Este ano estamos em abril e o cenário já se está a tornar negro", disse à Lusa Marinete Alves, que faz parte do Conselho Regional da Casa do Douro.

De acordo com a também dinamizadora da petição de 2024 "Salvem os viticultores do Douro", que chegou às 2.600 assinaturas, "ainda se iniciou agora o abrolhamento da vinha e [os viticultores] estão na iminência de não ter a quem vender as uvas, seja para a produção de vinho do Porto seja de vinho do Douro".

Os produtores "simplesmente não querem porque dizem que estão com 'stock'", referiu, confirmando que em causa estão cartas enviadas por pelo menos cinco produtores de vinho a mais de 150 viticultores.

Uma delas, a que a Lusa teve hoje acesso, fala no "acentuado decréscimo de consumo de vinho do Porto a nível global nos últimos dois anos", frisando a empresa que não irá "comprar quaisquer uvas brancas ou tintas DOC Porto, ou quaisquer uvas brancas ou tintas DOC Douro, em 2025".

"A verdade é que a esta empresa não resta outra alternativa que não esta decisão drástica, que lamentamos e para a qual apelamos à sua compreensão", refere a missiva enviada aos viticultores, no caso dos Vinhos Messias.

Para os viticultores, na sua maioria pequenos e médios, os próximos passos são "alertar as entidades responsáveis, nomeadamente o Governo, pela falta de medidas implementadas para resolver a curto prazo e minimizar os prejuízos que os viticultores estão a ter".

"Ponderamos manifestar-nos junto do Governo e, neste momento, com as eleições que agora [estão] à porta, as legislativas, mostrar o nosso desagrado e descontentamento boicotando as eleições", admitiu Marinete Alves, referindo que pode estar em causa evitar "a abertura das mesas de voto".

Os viticultores pedem "apoio direto, porque um viticultor que viva exclusivamente da viticultura não ter onde vender as suas uvas fica sem o seu modo de sobrevivência".

"O que vai ser destas famílias? É uma situação mesmo preocupante", alertou ainda, apontando que "as casas começam por prescindir dos pequenos viticultores", mas os "que tenham uma área considerável são os últimos a serem prescindidos por estas casas".

Segundo a viticultora, "os mais pequenos, que são realmente os que têm mais dificuldades, são os primeiros a serem penalizados".

A também presidente da associação Lutar pelo Douro deu nota que as pessoas estão a ficar "revoltadas pela falta de comportamento mais correto" por parte do Governo e do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP), acusando-os de não "assumir e resolver os problemas, que são sérios e graves".

"Sabem da situação e nada tem sido feito", sendo a situação "muito anterior" à possibilidade de imposição de taxas alfandegárias nos Estados Unidos da América, um dos principais mercados de exportação dos vinhos portugueses.

Os viticultores continuam a "aguardar o estudo que o senhor ministro [da Agricultura, José Manuel Fernandes] pediu sobre a aguardente ser produzida com uvas exclusivas da região do Douro" há quatro meses.

"Não podemos exigir a compra das uvas pelas entidades, evidentemente. A lei do mercado é esta, compra e venda, é assim, no entanto, até agora têm sido adotadas medidas de apoio ao comércio, nomeadamente com a destilação de crise. Nós exigimos, numa situação como a que está a acontecer, pelo menos a ajuda ao viticultor diretamente", vincou.

JE // JAP

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