
Este regresso à escola, segundo explicou hoje Cristina Machele, oficial do projeto "Toda a rapariga é capaz", foi possível através de campanhas de sensibilização comunitária promovidas por "facilitadoras e raparigas dos espaços seguros".
"Muitas adolescentes ganharam a coragem para voltar a estudar e superar barreiras impostas pela sociedade e, por vezes, pela própria família. Este suporte tem sido importante para que as raparigas possam retomar os estudos com determinação e confiança", reforçou a responsável.
O projeto está a ser implementado nos distritos de Murrupula e Nacarôa, norte do país, pelo consórcio formado pela Associação ActionAid Moçambique, Rede HOPEM e Visão Mundial, com o financiamento da Global Affairs Canadá.
Naqueles dois distritos o projeto conseguiu apoiar o regresso à escola de 153 raparigas, "depois de terem abandonado devido as uniões prematuras e gravidezes indesejadas", explica a Associação ActionAid Moçambique, acrescentando que dados do Ministério da Educação e Cultura indicam que, anualmente, 48% das raparigas em Nampula "abandonam a escola antes de completar o ensino secundário, sendo que a maioria das desistências ocorre entre os 13 e 17 anos".
Assim, regressaram à escola 136 raparigas de Murrupula, enquanto em Nacarôa foram contabilizadas 17 menores.
A responsável pelo projeto explicou que "entre as principais ações implementadas" no terreno estão "sessões educativas nos espaços seguros".
"São abordados temas como empoderamento da mulher, promoção dos direitos sexuais e reprodutivos e o desenvolvimento de habilidades para a vida", sublinhou Cristina Machele, citada na informação da Associação ActionAid Moçambique.
Acrescentou que o projeto também promoveu grupos de poupança e crédito rotativo, permitindo às participantes ter "acesso a recursos para cobrir despesas escolares e outras necessidades básicas".
O projeto "Toda a rapariga é capaz" pretende beneficiar cerca de 25.000 raparigas e mulheres jovens, com idades entre 10 e 24 anos.
Moçambique é o segundo país com mais casos de uniões prematuras na África austral, com 48% das raparigas a casarem antes dos 18 anos e 14% antes dos 15, segundo um relatório da organização não-governamental (ONG) Oxfam.
"Em Moçambique, a região do norte e a do centro são as que apresentam as maiores taxas de uniões prematuras, entre os 57% e os 62%, sendo Nampula e Cabo Delgado as províncias onde o problema é maior", lê-se no documento, noticiado na semana passada pela Lusa.
Segundo a Oxfam, Moçambique é ainda o décimo país no mundo e o sétimo em África com as taxas mais elevadas destas uniões, apontando como causas fatores como a pobreza, os desastres naturais e a insurgência armada no norte do país.
A ONG explica ainda que 36,1% das meninas que vivem em zonas urbanas casam-se antes dos 18 anos e 11,5% antes dos 15 anos, e em zonas rurais 55,7% casam-se antes dos 18 anos e 16,1% antes dos 15 anos.
Desde outubro de 2019 que Moçambique tem em vigor a Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras, que elimina uniões maritais envolvendo pessoas com menos de 18 anos, punindo com pena de prisão até 12 anos e multa até dois anos o adulto que se casar com uma criança.
A pena é igualmente extensível a adultos que participarem nos preparativos do noivado e a qualquer adulto que aceitar viver numa união arranjada por outras pessoas, quando tenha conhecimento de que o parceiro tem menos de 18 anos.
As sanções estão igualmente previstas para funcionários públicos, líderes religiosos e líderes tradicionais que celebrarem casamentos envolvendo menores de 18 anos, caso em que o servidor público será condenado a pena de até oito anos de cadeia.
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